Quando se tem mais idade, é natural que decepções sejam muitas, mas elas perdem de longe quando comparadas com as alegrias que a vida nos proporciona. Seja pela família, seja pelos amigos. Entre estes, pude fazer um de que jamais esqueço. Alfredo Machado. Mais velho do que eu, mais importante, amigo íntimo do então governador Carlos Lacerda, exerceu forte influência na cultura da então Guanabara, que ele amava muito. Foi um bom amigo e a retribuição que encontrei para homenageá-lo aconteceu quando criamos a Biblioteca Pública de São Cristóvão, a primeira de toda a vida do bairro imperial. Ganhou o nome de Alfredo Machado.
Com a esposa Glória, os filhos Sérgio, Sônia e Alfredo Júnior, além de grande número de amigos, fizemos a singela inauguração no Museu do Primeiro Reinado, sede de grandes acontecimentos do Império e da República. Ali, na década de 70, funcionou a reitora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, antes que se completasse o impressionante campus do Maracanã.
A idéia de dar o nome de Alfredo Machado à biblioteca teve a participação também de duas figuras especiais da nossa vida cultural. Ana Lígia Medeiros, diretora do Departamento de Bibliotecas da SEC, e Ana Maria de Oliveira Rennhack, figura importante da Editora Record, criada e dirigida durante muitos anos pelo homenageado. A BPAM nasceu com 5 mil volumes, doados pela diretoria da Record, com a promessa de ampliar esse número com todos os futuros lançamentos. Benefício evidente para os estudantes da região, antes desprovidos desse elementar ponto de apoio para o enriquecimento dos seus estudos.
Na ocasião, com muita atenção, pudemos recordar a vida de Alfredo Machado Filho de modesto funcionário dos Correios, foi jornalista aos 15 anos de idade. Em 1942 fundou a Editora Record, numa pequena sala da rua São José. Cresceu muito, graças ao seu arrojo e às excelentes relações mantidas com os nossos escritores. Lançou autores novos, como Zélia Gattai e Roberto Athayde, depois incorporando escritores famosos como Jorge Amado e Carlos Drummond de Andrade ao seu acervo. Passou a ser considerado o "Embaixador do Livro Brasileiro no Exterior", atividade que desenvolveu com mais empenho ainda quando assumiu o cargo de presidente do Sindicato Nacional dos Editores de Livros.
Alfredo Machado recebeu diversas condecorações e uma das que mais estimou foi a Medalha Machado de Assis, que lhe foi concedida pela Academia Brasileira de Letras, em 1978. Tornaram-se históricas as palavras do acadêmico Jorge Amado, naquela ocasião.
"Alfredo Machado, eficiente, infatigável e desabusado, parece-me simbolizar a indústria editorial brasileira dos nossos dias (...). Ele modificou e transformou por completo a indústria editorial no Brasil. Além disso, é a mais generosa das criaturas, amigo de dedicação inexcedível."
Mais do que justo, pois, que a sua memória tenha sido homenageada agora de forma tão expressiva, com o início das atividades da Biblioteca Pública que leva o seu nome.
Jornal do Commercio (Rio de Janeiro) 11/10/2004