ntigamente, havia um tipo de jornalismo baseado em enquetes. Era a peça de sustentação da reportagem. A mania vinha de longe: Marcel Proust, enquanto escrevia sua obra e ninguém sabia que ele era gênio mesmo, fazia jornalismo circunstancial e bolou uma famosa enquete, famosa, sobretudo, porque se limitava a uma série de perguntas idiotas que provocavam respostas imbecis —não fazendo justiça nem ao autor das perguntas nem ao autor das respostas.
Quando iniciei meu cavaco de letras, fui entrevistado por uma jovem que veio com um questionário. As perguntas eram as mesmas, de todos os repórteres: que livro levaria para a ilha deserta, qual o autor teatral preferido, gostava mais do verde ou do azul, essas coisas.
Nesse tempo, estava em moda, uma pergunta que, por coincidência ou propósito, fazia parte do questionário de Proust: "Como gostaria de morrer?" No que me tange e concerne, respondi sinceramente que não gostaria de morrer e o assunto acabou por aí.
Mas os outros entrevistados se derramavam em considerações que, feitas as contas, tinham uma constante: todos desejavam morrer em pé, como as árvores, num momento bom e positivo da vida. Nada da decrepitude, das veias esclerosadas, da cama hospitalar ou doméstica.
Jogador de futebol, radialista, artista plástico, compositor, comerciante, escritor, político, ministro, sacerdote ou torcedor do São Cristóvão, todos queriam morrer numa boa. Foi pensando nisso que, outro dia, examinando as folhas que se publicam por aí, desconfiei que o momento seria ótimo para o nosso país acabar em glória e numa boa.
Não é verdade. Com o Eduardo Cunha, Dilma, Lula, Operação Lava Jato, a lama no rio Doce, a seleção do Dunga e as minhas lamentáveis crônicas, o Brasil nunca entrará numa boa: será eterno.