A proximidade do dia 1° de janeiro de 2013, quando se tornará obrigatório, em nosso país, o respeito aos termos do Acordo Ortográfico de Unificação da Língua Portuguesa, torna essa discussão ainda mais acesa. O Brasil, na verdade, recebeu muito bem as poucas modificações propostas, entre as quais se incluiu o fim do trema, além de uma simplificação vernacular que já veio tarde.
Na imprensa portuguesa, vez por outra, publica-se crítica à existência do Acordo Ortográfico de Unificação da nossa língua. Alguns jornais afirmam que os filólogos brasileiros encheram o documento de "bizarrices inúteis", enquanto outros reclamam que a Academia das Ciências de Lisboa, parceira do projeto, errou pelo excesso de "cedências" às hipotéticas pressões neocolonialistas do Brasil.
É evidente que nada disso faz sentido. Devemos ter mesmo só uma forma de expressão escrita, para que o nosso idioma passe a ser, estrategicamente, adotado como uma das línguas oficiais da Organização das Nações Unidas. Falar é outra coisa. Cada um segue falando de acordo com a sua tradição.
Da mesma forma, não se pode defender a existência interna de uma separação linguística, dividindo o falar do rico e do pobre. O Vocabulário Ortográfico, editado pela Academia Brasileira de Letras, tem 370 mil verbetes, o que é uma amostra da sua força e da disponibilidade das palavras para todos. Machado de Assis fez toda a sua extraordinária obra de romancista com o emprego de somente 16 mil vocábulos.
Temos uma realidade plurilinguística, considerando-se basicamente que a norma padrão (culta) deve ser respeitada nos códigos escritos, pois são esses que, mais tarde, os estudantes terão que utilizar nos seus diversos concursos. Veja-se o que aconteceu na seccional paulista da OAB. Dentre os 20.237 candidatos (advogados formados -bacharéis em Direito) o índice de reprovação foi de 92,8%, o que levou o presidente Luiz Flávio Borges D'urso a afirmar que "há pessoas que chegam à prova e não sabem conjugar verbos ou colocar as palavras no plural." Vocês já imaginaram as petições que serão escritas por essa gente?
Para debater o assunto, que envolve também o uso exagerado do terrível internetês, as Academias Brasileira e Paulista de Letras realizaram seminários em defesa da língua portuguesa. Na ocasião, comemorou-se o fato de que a venda de jornais cresceu significativamente, nos dois últimos anos, o que desmente a tese catastrofista de que os impressos em geral serão desbancados em curto espaço de tempo pela mídia eletrônica. Num estudo intitulado "Médium Matters", da Universidade de Oregon (EUA), afirma-se que um leitor de jornal em papel retém o conteúdo mais que um leitor on-line. Isso parece ter sido percebido pelo povo brasileiro, inclusive os integrantes da sua ampliada classe média.
Antes de nos entregarmos totalmente ao emprego do tablet, convém que se preparem mais adequadamente os nossos professores e especialistas. Encher as escolas, desordenadamente, de computadores de todos os tipos não será a forma de promover o que é essencial: o conhecimento mais profundo dos mistérios e da beleza do idioma de Fernando Pessoa e Manoel Bandeira.
Jornal do Commercio (RJ), 7/6/2012