Eu já trouxe alguns instantes de Jô Soares. Volto a ele, sinto falta do amigo de uma época em que éramos jovens. Tempos de iniciação, usufruindo a vida. Naqueles anos de Última Hora, ele já tinha certo nome na TV. Mas ainda era uma pessoa que podia circular sem assédio. À noite, tudo era tranquilo. Um dos locais que frequentávamos era o Cine Apolo, na rua Conselheiro Nébias agora estacionamento. Neste cidade, o que não vira prédio vira estacionamento. Ali havia filmes e teatro rebolado que influenciou muito nosso amigo - com vedetes de biquíni. Na fila do gargarejo, Arley Pereira e Jô, repentistas, contracenavam com as comediantes e o público morria de rir. Certa vez, uma delas disse uma frase e completou: 'Suspanse'. Jô gritou: 'É suspense, minha filha'. E ela: 'É suspanse! O senhor não sabe nada de francês'. Simplesmente era a segunda língua do Jô.
Na altura de 1964/65, surgiu no Brasil o monoquíni, criação do estilista Rudi Gernreich. A parte inferior era sustentada por um finíssimo suspensório que cobria os seios da mulher. Nessa época, Jô montou um pocket show no Teatro de Arena com Sheila, uma loirinha que imitava May Britt, atriz sueca. Sheila, que foi personagem de meu conto A Moça Que Usava Chupeta, em meu primeiro livro, Depois do Sol, foi pioneira na promoção do monoquíni, que não pegou nas praias.
No final de 1963, o cineasta Fernando de Barros esteve na Itália dirigindo um documentário sobre o revolucionário grupo de moda da Rhodia, criado por Livio Rangan. As estampas dos tecidos eram assinadas por artistas como Di Cavalcanti, Cyro Del Nero, Darcy Penteado, entre outros. A música era de Sérgio Mendes e o trombone, de Raul de Souza, gênio. De Roma, seguiram para Spoletto, Florença, Veneza e Beirute. No grupo, duas modelos celebridades, Mila Moreira e Lucia Curia. O texto desse documentário coube ao Jôeamim. Ele incluía piadas, deixava o humor correr. Admirável a criatividade, o homem sacava uma em cima da outra, em momentos que pareciam não ter nenhuma graça. Ali, vi o que é o humorismo. A rapidez em pegar o instante e transformá-lo em gargalhada.
Nesta altura, Jô tinha criado um personagem e contava a todos nós. O Jânio e as forças ocultas. O presidente da falsa caspa no paletó renunciou e deu como motivo 'forças ocultas', que nunca se soube quais eram, mas entraram para o cotidiano. O personagem era Jânio idoso e gagá, cara cheia, em um bar da Vila Maria, a propor a cada um: 'Paga uma branquinha e te conto a história ds forças ocultas'. Ah, como tem forças ocultas hoje. O curioso é que ele nunca concretizou o personagem na tevê.
PS: Se lhes aprouver, na tarde de hoje, entre15he18h, estarei na Livraria Martins Fontes (Avenida Paulista 509), autografando meu novo romance, Deus, O Que Quer de Nós? É JORNALISTA E ESCRITOR, AUTOR DE 'ZERO' E 'NÃO VERÁS PAÍS NENHUM'.