Um dos símbolos do capitalismo, o investidor Warren Buffett tem uma frase definidora dos momentos de crise: “Você só descobre quem está nadando pelado quando a maré baixa”. Quando a crise econômica de 2008 explodiu, começou a aparecer muita gente pelada, e empresas e países até hoje vivem às voltas com esqueletos daquele momento.
As reformas econômicas necessárias para superar a crise, especialmente nos países em desenvolvimento, trazem consigo conflitos. Em diversos pontos do planeta surgiram, e ainda surgem, manifestações populares contra a alta dos preços, a falta de serviços públicos adequados, a globalização excludente, o capitalismo selvagem que aumenta a desigualdade, a pressão por produtividade num mundo cada vez mais tecnológico.
Na França veem-se protestos diários contra a reforma da Previdência, depois de quase um ano de manifestações dos "gilets jaunes" que refletem as dificuldades da classes médias rural e urbana em enfrentar reformas que aumentam impostos. As redes sociais ajudam a espalhar o descontentamento, desencadeando tanto a Primavera Árabe, um anseio de liberdade, como a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos, ou a aprovação do Brexit na Inglaterra, manifestações de protesto dos que se sentem excluídos, ou temem sê-lo.
No Brasil, tivemos as manifestações de 2013 que desembocaram na eleição de Jair Bolsonaro à presidência da República. Os fenômenos de massa quase sempre eclodem devido a uma faísca que encontra material combustível para provocar o incêndio. Na Tunísia em 2010, foi o achaque dos fiscais do governo contra um ambulante que tocou fogo literalmente nos protestos. No Brasil em 2013, foi o aumento dos ônibus, assim como no Chile agora, que desencadeou a crise. No Irã, no mês passado, manifestações contra o preço dos combustíveis provocaram repressão violenta do governo, com cerca de 300 mortes, segundo números divulgados ontem pela Anistia Internacional.
O governo Lula iniciou-se com uma continuidade da reforma da Previdência iniciada pelo de Fernando Henrique Cardoso. O desgaste que sofreu entre seus aliados sindicalistas fez com que deixasse de lado o aprofundamento das reformas. Hoje, o temor de que mudanças no serviço público por uma reforma administrativa provoquem reações de corporações organizadas, paralisou a ação governista.
Outros sinais de insatisfação estão sendo detectados, como ameaças de nova greve dos caminhoneiros, que Bolsonaro apoiou quando ainda era candidato. Desta vez, é a CUT (Central Única dos Trabalhadores), ligada ao PT, que tenta se aproveitar da insatisfação.
O ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas atribuiu o fracasso da anunciada greve ao diálogo que diz existir entre a categoria e o governo. “Há um respeito muito grande nosso com caminhoneiros, e um respeito muito grande dos caminhoneiros com a gente. Conseguimos realmente estabelecer um diálogo, eles sabem que têm as portas abertas, e a cada dia a gente constrói uma solução.”
Parte dessa construção, o presidente Bolsonaro sentiu-se obrigado a reconhecer ontem que o preço dos combustíveis está alto no país, abordando indiretamente uma das reformas que estão no forno do governo, a tributária. “Na refinaria o preço está lá embaixo, ele cresce e fica alto por causa de quê? Impostos estaduais, ICMS, basicamente. E depois o monopólio que ainda existe na questão de distribuição, e nós estamos buscando quebrar esse monopólio para diminuir o preço. Só com a concorrência ele pode diminuir. Estamos fazendo o possível para baratear o preço do combustível”.
Os sinais da melhora da situação econômica estão evidentes, e já se refletem nos números do mercado financeiro, levando a que a nota do Brasil nas agências de risco seja mais bem avaliada. Os juros baixos como nunca ajudam a reduzir o déficit do governo, e a inflação continua sob controle, aumentando o crédito. É preciso que esses reflexos cheguem ao emprego, e ao dia a dia do cidadão.