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Música Aquática

 

A modelo Kate Moss destruiu uma série de gravações inéditas de seu namorado, Jamie Hince, da dupla The Kills. De acordo com o jornal "Daily Mirror", Moss e Hince se envolveram em uma discussão ao cabo da qual a top model britânica arremessou uma bolsa do músico contendo um notebook com seis faixas da banda em uma piscina. Hince não conseguiu salvar os dados contidos no computador portátil. "Jamie ficou muito abalado. Ele tentou recuperar o notebook, removendo o disco rígido e deixando-o secar em um armário ventilado", disse uma fonte próxima ao músico. Cotidiano, 28 de junho de 2009


QUE ELA era temperamental, ele sabia. Mas aquilo passava de qualquer limite: jogar na piscina um notebook com seis -seis!- músicas inéditas, era mais que uma agressão, era puro sadismo. E ainda assim ele não protestou, não disse nada.


Porque a verdade é que, apesar das brigas (ou quem sabe justamente por causa das brigas?) ele a amava. E, porque a amava, perdoava-a, tratava de esquecer seus rompantes, suas ofensas, seus ataques de fúria.


De modo que resolveu se concentrar na tarefa de recuperar as seis faixas sonoras. A medida mais óbvia, extrair o disco rígido e secá-lo, não funcionou. Procurou então um afamado especialista de informática.


O homem fez o que pôde, passou dias trabalhando, mas igualmente fracassou. "O jeito é tentar lembrar as músicas", disse, à guisa de consolo. O problema é que ele não conseguia lembrar tais músicas.


Elas simplesmente tinham sumido de sua memória, coisa que representava mais um triunfo da arrogante namorada. O jeito era esquecer, tocar em frente, esperar que um dia a inspiração lhe voltasse. Quando isso aconteceria, ele não tinha a menor ideia. No meio tempo trataria de se distrair, de fazer outras coisas.


Nadar, por exemplo. Era algo de que gostava muito -não por outra razão tinha piscina em casa. Nadando, esquecia dos problemas, de tudo. Nadando e mergulhando.


E foi mergulhando que ele teve aquela incrível surpresa. Estava ali, no fundo da piscina, em meio ao silêncio absoluto, o silêncio que só equivalia em beleza à própria música, quando de repente ouviu fracos e melodiosos acordes.


Imediatamente reconheceu-os: eram o início de uma de suas composições. O que significava aquilo?

Seria uma alucinação, confortadora e compensadora alucinação? Ou teria a música gravada no notebook, de alguma maneira, impregnado a água da piscina?


Mais que depressa ele saiu da água, disposto a gravar o que tinha lembrado. E então o choque: fora da piscina, não recordava nada, absolutamente nada, nenhuma nota. Sua música agora era um produto aquático, um aditivo da água.


Tem passado horas mergulhado na piscina, para espanto da namorada, que não cessa de recriminá-lo por causa disso. Mas ele não lhe dá bola. A piscina agora é o seu mundo.

Ali ele está feliz, sozinho com sua música.


Sozinho, não. Nos últimos tempos, tem avistado uma bela moça que, sob a água e em um canto da piscina, lhe sorri. Quem é, ele não sabe. Talvez seja uma sereia das piscinas (sim, sabe-se que elas existem). O fato é que agora tem companhia. Tem um novo mundo onde viver.


Folha de S. Paulo, 6/7/2009