RIO DE JANEIRO - Encontrei-a por acaso. Era alta, mais para bonita, com dois olhos imensos e negros, a pele muito branca e suave. Com esforço de memória e imaginação, poderia parecer uma estátua grega, mas para isso seria necessário cegá-la, estátuas gregas têm olhos vazados.
Ela pediu meu e-mail para mandar um trabalho que fizera sobre a violência nas grandes cidades, tema que a preocupava. Tivera uma amiga currada e assassinada numa rua da Tijuca, os jornais nem deram a notícia, os assassinos eram classe média, um deles era filho de um cara importante.
Perguntei-lhe o nome e ela disse que se chamava Eloína. Mas não gostava dele, era uma mistura do nome do pai, que se chama Elói, e de sua mãe, que é Regina. Estranhei aquilo. Afinal, Eloína não é um nome tão feio assim, muitas moças têm esse nome. E há nomes piores, que já saíram de moda, poderia citar um milhão deles.
Mas ela insistiu. Disse que o "Eloína" era o que sobrara do casamento dos pais dela. Os dois se separaram, nada mais tinham em comum, coubera-lhe a herança idiota de prolongar um amor que acabara num nome que ela não amava.
Achei a moça triste, dizendo uma coisa triste. E eu caí na asneira de comentar que ela talvez tivesse razão. O ideal teria sido que o nome fosse mágico o suficiente para conservar juntos o Elói e a Regina. Mas seria egoísmo exigir que, por causa de um nome, os dois continuassem infelizes.
A moça olhou com raiva para mim. Respondeu com uma voz irritada. Ela não era um nome. Era uma jovem feita de carne e sangue, tinha direito também de ser feliz. De amar e ser amada.
Dei-lhe razão. Onde quer que estejam, tanto o Elói como a Regina, que deram vida e nome a Eloína, devem pensar no tão pouco que custaria fazer a moça feliz.
Folha de S. Paulo (SP) 30/3/2008