Não deixa de ser curiosa a tendência dos profissionais da mídia, a nacional e a internacional, em relatar os preparativos do conclave que elegerá o novo papa. Tratam a questão como se fosse uma convenção de partidos políticos, a aprovação pelo Congresso de uma MP, a queda ou a nomeação de um ministro. Reclamam da inexistência daquilo a que estão mais habituados: as "fontes", que dão o serviço para os profissionais que se mostraram úteis no passado.
É evidente que há correntes e até mesmo conchavos entre os cardeais, mas em bases distintas, firmadas e confirmadas numa tradição secular que, bem ou mal, tem dado certo. Se o conclave de 1978 tivesse sido aberto, aceitando análises, sugestões e pressões dos profissionais da mídia, jamais um desconhecido cardeal polonês teria sido eleito.
O estupor que predomina na mídia, no momento, é sobre o silêncio "imposto" aos cardeais. Jogam a culpa na personalidade autoritária e conservadora do cardeal Joseph Ratzinger, que foi a sombra de João Paulo 2º em várias questões e terá forçosamente papel importante no conclave. O silêncio não é invenção dele.
Como qualquer outra instituição, a igreja tem o mesmo direito das associações que se dedicam à filatelia, à numismática, aos "boards" que dirigem bancos e empresas que são obrigadas a adotar, em sigilo, o planejamento para os exercícios a curto ou a longo prazo.
Compreende-se a frustração dos profissionais da mídia, habituados a receber informações quentes de como se processam as coisas num determinado setor. Vivem disso, valorizam-se com isso, mesmo quando não conseguem as ambicionadas "inside informations".
Todos apreciariam andar nos corredores vizinhos à capela Sistina como andam nos corredores dos Congressos nacionais, dos palácios presidenciais, nos corredores da Rede Globo, perseguindo furos. Mas o furo do conclave, certo ou errado, é mais em cima.
Folha de São Paulo (São Paulo) 17/04/2005