Regina Duarte tem todas as condições para assumir a Secretaria de Cultura, e integrará a parte tecnicamente competente do governo Bolsonaro. Ela conhece bem o ambiente cultural brasileiro, é séria e sensata, e acredito que não seja adepta dessa política de bateu, levou, e de ficar falando mal das pessoas pelas redes sociais.
Até agora, foi a melhor indicação do governo Bolsonaro para a Cultura. Ela enfrentará muitas dificuldades, mas acredito que terá condições de fazer um acordo na área cultural, pois uma parte influente já se convenceu que ajudar Regina Duarte a fazer um trabalho de apaziguamento é mais benéfico para a classe como um todo do que permanecer nessa guerra ideológica que só leva ao isolamento.
O problema maior será mesmo o próprio presidente Bolsonaro e seu entorno, especialmente os filhos, que não têm uma visão do que seja cultura, e atiçam suas milícias digitais para derrubar qualquer ministro que se coloque acima dessa radicalização patética que rege o governo Bolsonaro.
O exemplo do General Santos Cruz é autoexplicativo. Um militar sensato, sensível, que entendeu a grandeza da presidência da República, amigo do presidente há mais de 40 anos, foi abatido por intrigas palacianas de quinta categoria, e até mesmo mensagens falsas de WhatsApp foram montadas para inviabilizar sua presença no Palácio do Planalto, onde era das poucas vozes sensatas a aconselhar o presidente da República.
Na verdade, Bolsonaro emprenha-se pelo ouvido, como se diz popularmente. Qualquer intriga tem boa acolhida no perfil paranóico do presidente Bolsonaro, que acha que esta sendo sabotado por todos à sua volta, com exceção dos filhos, quando, na verdade, são os filhos que o boicotam involuntariamente.
O governo começou defendendo “filtros” nos financiamentos públicos de filmes e peças de teatro, o que provocou a demissão do primeiro secretário de Cultura, Henrique Pires, em protesto contra a vedação de financiamentos para filmes de temática LGBT.
Regina Duarte já se manifestou a favor de financiamentos de filmes como Bruna Surfistinha, que o presidente Bolsonaro já disse que não deveria ter sido financiado com dinheiro público. Como se coubesse ao governo definir que tipo de filme o cidadão deve assistir.
Usar o dinheiro público para financiar filmes de cunho religioso, ou que enalteçam os valores da família cristã é que não é papel de um governo laico e republicano. Regina Duarte já deu entrevistas onde revelou, mesmo antes de ser nomeada, e também muito antes de essa hipótese ser aventada, que considerava, por exemplo, que a Lei Rouanet não deveria ser utilizada por pessoas famosas, que encontram patrocínios com facilidade.
Ela, no entanto, já fez uso da tal lei de incentivo à cultura, e tem uma prestação de contas em disputa na secretaria de cultura. Regina também já criticou essa polarização política que domina a área cultural, reflexo da disputa entre esquerda e direita também aqui.
Regina Duarte já se disse respeitadora dos que pensam diferente dela, se define como um conservadora, mas não distrata os de esquerda. Mas recentemente retuitou um vídeo de crítica ao que chamam de “marxismo cultural”, dando apoio integral.
Tem sido atacada com leviandade e grosserias por um tipo de esquerdista que se considera dono da verdade, que não admite que ela tenha aceitado o cargo. Aceitar ser parte do governo Bolsonaro seria uma prova de que ela é uma fascista, o que por si só é uma bobagem histórica.
Ser de direita não é ser fascista. Querer participar de um governo ideologicamente afinado com seu pensamento é um sinal de dedicação à cultura, ainda mais Regina Duarte, que não precisa mais de prestígio popular. Ao contrário, a incorporação dela ao seu ministério ajuda muito mais a Bolsonaro.
Espanta-me a alegria com que Regina Duarte está assumindo cargo tão espinhoso, parece que ela não tem ideia do que Bolsonaro pensa sobre a área que vai comandar. É uma fria assumir a Cultura, mas Regina Duarte tem todas as qualificações. Inclusive tamanha popularidade que pode constranger eventuais arroubos autoritários na área.