Muitos ficaram chocados com a declaração do papa Francisco, que confessou a sua condição de pecador. Informadores de opinião, cronistas e co- lunistas de vários tamanhos e feitios lembraram os problemas e crises que a igreja está atravessando, e se o próprio papa admite ter cometido pecados, citam os escândalos das finanças do Vaticano e os numerosos casos de pedofilia de bispos e padres.
Admitindo que é também um pecador, o papa seria um pedófilo ou um ladrão dos bens religiosos? E aí? Seria o fim, o fim finalmente final da Igreja Católica Romana?
Desde os tempos do catecismo, lá em Buenos Aires, Francisco aprendeu o ato de contrição que os católicos do mundo inteiro rezam depois da confissão e antes de cada missa: "Eu pecador, me confesso a Deus...". E logo vem, sem nenhum disfarce e em forma pleonástica: "mea-culpa, mea maxima culpa".
Não se trata de uma humildade ritual, mas de uma decorrência da condição humana, expressa pelo próprio Cristo na única oração que ousou ensinar a seus discípulos: "Livrai-me de todo o mal". Muitos devotos pensam que o "mal" em questão é o câncer, o desemprego, a morte. Nos Evangelhos há aquela passagem no horto das oliveiras em que Jesus, suando sangue, sentiu na carne o sacrifício que ia fazer e pediu que o Senhor o livrasse daquele "cálice".
Foi seguramente a única ocasião em que a sua condição humana se contrapôs à sua condição divina. Em certo sentido, um pecado que tornaria inútil toda a redenção, inútil todo o projeto da salvação.
Se o próprio Cristo pecou por hesitação, covardia e traição ao plano divino, não seria um mero papa que se colocaria acima do desígnio de Deus. Todo e qualquer católico sabe o que faz quando bate no peito e confessa a culpa que é só sua, "mea-culpa, mea maxima culpa".
Folha de S. Paulo (RJ), 4/6/2013