Guerra, qualquer guerra, é acima de tudo uma estupidez. Mas ela faz parte da civilização e, mais do que isso, faz parte da dinâmica histórica.
Dois conflitos abertos, mas localizados, estão em processo. No Afeganistão, a guerra é considerada "assimétrica", como se houvesse guerra simétrica. No Oriente Médio, o furo é bem mais em cima, pois é antigo e, ao contrário do que ocorre na Ásia Central, parece não ter solução, nem mesmo aquela da tradição, ou seja, a vitória do mais forte.
O curioso é que, de acordo com os pontos de vista, são criados vilões, heróis e, em alguns casos, uma legião de mártires. Para ficar em dois emblemas, temos de um lado o herói Sharon e de outro o mártir Arafat.
São inimigos pessoais - o que não deixa de ser um complicador na questão. Semanas atrás, Arafat telefonou para Shimon Peres, o único líder de Israel que pode ser considerado seu amigo, e gritou: "Shimon, estão me assassinando!"
Do jeito como as coisas estão se passando, a morte de Arafat não deve ser considerada um episódio de guerra, mas um assassinato mesmo. O próprio Sharon admitiu que deveria ter matado o líder palestino há mais tempo.
E, por falar em Sharon, para muitos ele é um herói, para outros, um açougueiro. Sua eficiência militar na guerra do Yom Kippur, em 1973, fez os soldados israelenses colocarem nos seus tanques, aviões e canhões a inscrição: "Sharon, rei de Israel".
O cerco pessoal a Arafat não se enquadra - repito - num episódio de guerra. É uma caçada pessoal que de nada adiantará ao projeto de paz para a região. Qualquer analista de bom senso proclama abertamente que a situação do Oriente Médio é ruim com Arafat, mas que será pior sem ele.
Sharon deve saber disso. Mas é um herói para os radicais de seu país. E Arafat é o primeiro a se considerar um mártir.
Folha de São Paulo em 03/04/2002