Sim, o verão acabou. É bem verdade que ainda faz calor --havia sol lá fora, derramando uma luz crua sobre as águas escuras da lagoa Rodrigo de Freitas. Pela manhã, os barcos de regata que passam em frente à minha varanda são silhuetas esguias, da cor dos violinos, cortando a carne da lagoa. O rastro do barco é de espuma branca, quase cor de prata.
Leio nas folhas que a lagoa está melhorando, pouco a pouco suas nascentes serão recuperadas, não há tantos peixes mortos boiando para o lado do túnel e, às vezes, há pescadores jogando tarrafas contra a escuridão. Sim, há vida na lagoa.
Mas o verão acabou e é possível que os pescadores se recolham e recolham suas redes inúteis. É evidente que não faz frio aqui nessas bandas, mas um bom carioca sente-se obrigado a sentir frio quando a temperatura abaixa dos 30 graus. Todos se acautelam, temendo borrascas invernais, geleiras eternas, frios siberianos.
Mas ainda dá praia, mansa praia de manso mar, as gentes são outras, são outras as moças de biquínis mais comportados. São raros os biquínis, raríssimas as tangas. Tempos atrás, os entendidos garantiram que a humanidade havia atingido um ponto de não retorno, ou seja: maior nudez seria impossível, embora não apreciadas.
O problema não me atinge. Para uso e gosto particular prefiro um padrão mais ou menos convencional em termos de praia e mulher. Na lascívia infantojuvenil que persegue homens maduros, nada é mais sensual do que um corpo de mulher enrolado numa toalha, e aí vai a explicação para as vestes gregas e romanas. Frineia as usava e, diante dos juízes, arrancou a túnica e foi absolvida.
O verão acabou. Mulheres, barcos e Frineia, tudo parece recolhido como as redes dos pescadores, até novo verão. Quanto ao mar, não há mesmo inverno por aqui, mas é bom olhar o mar. Como se eu o merecesse.
Folha de S. Paulo(RJ), 1/6/2014