Vira, de vez, a página, com a Operação Lava Jato, a maturidade democrática do país, na sequência da Marcha dos 100 mil, ou do Fora Collor, ou da ida às ruas em 2013. Não há precedentes quanto ao número de prisões e ao tamanho das penas, a desbaratar, finalmente, um quadro de corrupção generalizada que deparamos. Só que não é um fenômeno do governo petista, mas do desvelamento, de vez, da secular política de clientelismo que marcou toda a história da República, na clássica e aceita privatização dos dinheiros públicos pelos donos do poder.
Emerge, ao lado do Ministério Público, a absoluta autonomia do poder de investigação policial. E, mais ainda, observamos, quase como crime continuado, a obstacularização dos processos, na interferência sobre os probatórios pelos senhores da República. Por força, os precedentes lá estavam, há décadas, num quadro de acusações invariavelmente levadas ao seu arquivamento como fato anódino da convivência republicana. Só há, aliás, a atentar ao protagonismo, nesses crimes, de todos os partidos na consagração da unanimidade do clientelismo político.
Mas ainda, as atuais investigações demonstram a equalização das propinas na rotação das superempresas – num quase consórcio do acesso à obra pública – e a tranquilidade na sua absorção, no adicional do seu gasto nos orçamentos da República. Para muitos, haveria a falar num verdadeiro consórcio de vantagens entre as empreiteiras, criando um lobby fechado, a demonstrar a enorme distância entre os happy few e a massa dos pretendentes à execução de obras públicas.
Já irreversível, também, na nossa maturação democrática é o inapelável do probatório que a escuta telefônica permite, no montante inédito de cerca de 80 mil mensagens investigadas. No largo debate que se abre, já se venceu a demora dos probatórios, mas fica o âmbito real dos tráficos de influência. Não se exclui, inclusive, que os processos possam chegar até a tabelas na regulação por um indiscutível mercado competitivo. De toda forma, o montante de 80 mil mensagens, só à conta do ex-presidente da OAS Léo Pinheiro, evidencia como mal chegamos à ponta de um iceberg no que será o Brasil de após a Lava Jato.