A delação premiada de Emílio Odebrecht, presidente do Conselho da empreiteira que leva o sobrenome de sua família, pode ser considerada a mãe de todas as delações, não apenas porque ele escancarou as relações impróprias com seu amigo, o ex-presidente Lula, como ampliou o escopo do cartel que atuava na Petrobras e outras estatais.
Emílio admitiu o que já se supunha, mas não estava provado: as decisões do cartel eram tomadas diretamente pelos controladores das empreiteiras, e os executivos que estão presos ou denunciados eram apenas a parte mais visível da operação.
Devido aos detalhes que ele revelou aos procuradores de Curitiba, vários, se não todos os controladores das empreiteiras que até agora estavam fora das investigações oficiais da Operação Lava Jato, apresentaram-se espontaneamente em Curitiba para depor, cientes de que já não era mais possível esconder suas participações diretas no esquema de corrupção.
O cartel, formado pelas empreiteiras Odebrecht, UTC, Camargo Correa, Andrade Guttierrez Mendes Júnior, OAS, Queiroz Galvão, a Iesa, a Engevix, e a Galvão Engenharia, teve todos seus principais executivos presos ou já condenados, mas nenhum dos controladores, à exceção de Emílio Odebrecht e seu filho Marcelo, aparecera até agora entre os investigados, o que não significa que não o estivessem sendo.
Mas, depois que correu no meio jurídico e empresarial a informação de que Emílio havia aberto a atuação dos controladores das empresas nas decisões cruciais, eles passaram a procurar Curitiba para evitar uma prisão ou no mínimo uma condução coercitiva.
Um empresário de peso à época do esquema de corrupção que tomara essa decisão foi Eike Batista, que se apresentou espontaneamente aos procuradores de Curitiba para contar sua versão dos fatos de sua relação com a Petrobras e outras estatais.
Não houvessem já provas cabais de que o instrumento da colaboração premiada fora excepcionalmente eficiente no desvendar do esquema de corrupção, no caso específico da família Odebrecht ela foi decisiva.
No início, mesmo depois de preso, Marcelo Odebrecht dizia que não tinha nada a delatar, criticando quem o fizera, classificando-os de "dedo duro". Ficou famoso seu depoimento à CPI da Petrobras quando disse que em sua casa era capaz de punir mais gravemente um filho que dedurasse o outro por um malfeito, revelando sua visão distorcida de mundo a respeito do que era a delação premiada.
Numa contradição em termos, ele, e também seu pai Emílio, viviam apontando que seus "valores morais" os impediam de fazer delações. Ao verificar que não havia saída, e que provavelmente perderia a empresa se insistisse nessa falsa posição de inocência, o próprio Emílio Odebrecht ofereceu-se para fazer uma delação premiada, a fim de levar seu filho a acompanhá-lo.
Seguiram todos os rituais previstos nos acordos, inclusive a publicação de um anúncio nos principais jornais do país pedindo desculpas por "práticas impróprias", como já fizera a Andrade Gutierrez, do empresário Sérgio Andrade, que admitiu "erros graves".
Hoje, depois que os 77 executivos da Odebrecht fizeram suas delações, Emílio usará tornozeleira eletrônica e seu filho Marcelo ficará na cadeia por mais algum tempo até poder ir para casa em prisão domiciliar. Os demais controladores das empreiteiras começarão agora a pagar suas dívidas à Justiça.