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Lula e o luxo de seu povo

 

O avanço da popularidade presidencial tornou-se um bordão em nossa conjuntura política. Desarvora as oposições neste quadro inédito para o meio de um segundo mandato. O Presidente atravessou todas as crises e vaticínios de catástrofe em que o açodamento da revanche acabou por perder o pé, diante de um país cada vez mais surdo à retórica do velho regime.


Lula sobreviveu à crise do PT, e mantém hoje estes 67% de aprovação em que se embutem 50% de um eleitorado cativo, disposto a votar sem hesitação no desejo do Planalto. Este apoio não passa por nenhum prognóstico de carisma aplastante, obedecendo ao vaticínio de um crescente personalismo presidencial.


Não nos demos conta, talvez, do impacto internacional em que hoje Lula combina uma nova prosperidade continuada do país e o respeito entranhado à democracia  na sua mais cuidada partitura. E é nesse quadro que se destaca de futuros tenebrosos na América Andina onde o mais obsceno personalismo político assume o desmonte das liberdades e a ambição da Presidência permanente.


O segredo de nosso homem no Planalto é a intimidade do encontro, e do apego coletivo que entremostra essa enorme dificuldade, inclusive, de demitir ou desfazer-se da equipe ministerial. É a visão de um “estar junto” no poder, que marca, em profunda ressonância popular um jeito de governo tão distinto do pódio de Collor, ou dos “Ministérios de notáveis” dos governos militares.


Este “povo de Lula” deu um passo adiante no que são já as prioridades da mudança, das que sente em sua carne e que nada tem de comum com a litania moralista em que permanece o cantochão das oposições. O eleitorado do Presidente não se comoveu com as novas erupções do cartão corporativo, na mesma seqüência do mensalão e do ainda inextirpável patrimonialismo do poder.


Perdeu-se o PT na infecção de “ser governo”, mas em nada o abate prejudicou o novo pacto social objetivo com Lula na chegada a Palácio. As maiorias quase excessivas, com que o governo, PT ou não, estão expostas à alavanca programática do nosso situacionismo. Não são mais clientelas do statu quo de antes da vitória de 2002.


Não é para todo o sempre que o país perseverará na cosa nostra, e o Congresso está aí, entre cassações impossíveis e Comissões de Inquérito, para definir uma temperatura em baixa da corrupção brasileira. Seu aguilhão da mudança é o desta nova consciência selvagem do “povo de Lula” que inclusive repta o velho PT. De choque em choque, as oposições só podem aspirar à resistência dos quoruns de reforma constitucional. Mas, o impasse do CPMF foi o das definitivas exéquias do golpismo brasileiro.


O grosso das reformas, inclusive, não precisa desta batalha da Carga Magna, e a alteração dos regimes políticos, ou tributários se podem negociar dentro das maiorias tépidas de que já dispõe o governo. Mas não é por elas que passa, o que impacta o “povo de Lula”, beneficiário da redistribuição objetiva de renda, da dimensão da nova lavoura familiar, ou do acesso à mudança pelos serviços de saúde ou educação, permitido pela Bolsa-família.


O novo e o subversivo da popularidade crescente de Lula prescinde do valor objetivo destes resultados. Mede-se pelo arcaico das resistências, capaz de tornar patético o que venha agora do Brasil do outro lado. Depois do cartão corporativo, quem sabe, a denúncia do consumo escandaloso, ou correto, do xampu do funcionalismo público, ou do esmalte de unhas das escriturarias em palácio?


Jornal do Commercio (RJ) 22/2/2008