Pouquíssimas vezes fui obrigado a concordar tanto e tamanhamente com o presidente Lula. Sua Excelência declarou, na semana passada, que é a favor da reforma política e, sobretudo, que é necessário, para início dos trabalhos, "moralizar a base".
Dou-lhe razão quando entendo que a base citada por ele é a própria base social, a sociedade como um todo, os indivíduos que a formam e formam a nação. Já dizia não sei quem: não adianta socializar a sociedade sem antes socializar o indivíduo. Trocando-se o "socializar" por "moralizar", dá na mesma.
Lendo a declaração presidencial com atenção, verifiquei que estava errado, mas o presidente também estava errado. A base a que ele se referia era a do Congresso. Vale dizer, a sua base, aquela que vota a favor dos interesses do seu governo e do seu partido. É outra coisa, ou melhor, é outra base.
Nos escândalos que traumatizam a vida pública, foram as cúpulas do PT e do PSDB, no atual e no anterior governos, que abriram as porteiras para a corrupção considerada a maior de nossa recente história.
Foi o pessoal de cima que descobriu a existência do chamado baixo clero na Câmara dos Deputados, a turma insatisfeita por diversas razões, preterida nas verbas, nos cargos, na exposição mínima e necessária à vida parlamentar.
Descoberto o veio, foi por aí, preferencialmente, mas não exclusivamente, que a corrupção cavou o pretendido ouro das aprovações, desde as medidas provisórias mais catimbadas à emenda constitucional da reeleição e das privatizações.
Nada mudará (a não ser para pior) se não houver a reforma política em sua estrutura operacional e moral. Moral vem do latim, "mos, moris", no plural significa "costumes".
Mas a reforma em si não basta para sanear os costumes da política. Se moralizar é preciso, moralize-se a base, mas, antes de tudo, moralize-se aqueles que a corrompem.
Folha de São Paulo (São Paulo) 03/10/2005