Quem não sonhou, um dia, com um lugar perfeito? Como a ilha dos Prazeres, perto da Toscânia, em que as crianças não precisam estudar nem lavar atrás das orelhas. Foi aonde levaram Pinóquio. Ou a ilha do Tesouro, na costa do México, onde, em 1754, o corsário inglês Flint enterrou uma arca com 700 mil libras. Ou a Terra do Nunca, onde os garotos, como Peter Pan, não crescem e não se tornam adultos. Pena que esses lugares só existam na fantasia de seus criadores, respectivamente Carlo Collodi, Robert Louis Stevenson e James M. Barrie. Aqui, no nosso quintal, os equivalentes seriam a Pasárgada de Manuel Bandeira, a Maracangalha de Dorival Caymmi ou a Platiplanto de José J. Veiga.
E há lugares imaginários que, paradoxalmente, existem, embora de difícil localização no mapa, por suas fronteiras difusas. O mais célebre deles foi detectado em 1974, pelo economista Edmar Bacha: o reino de Belíndia, um mix da Bélgica com a Índia, onde o lado indiano dava duro para o crescimento econômico, mas este só beneficiava o lado belga. Como, aliás, o PIB brasileiro durante a ditadura militar.
Na esteira de Bacha, Mario Henrique Simonsen detectou Banglabânia, misto de Bangladesh com Albânia, onde o já péssimo sempre podia piorar. Delfim Netto, por sua vez, descobriu a Ingana, mistura de Inglaterra com Gana, com seus impostos de país europeu e serviços públicos de Terceiro Mundo. E Bacha também localizou Rumala, uma combinação de Rússia com Guatemala —uma elite corrupta associada a uma alta taxa de criminalidade.
Há pouco, sob as trevas de Bolsonaro, Bacha descobriu também que o Brasil, com suas florestas em chamas e o garimpo ilegal nos territórios indígenas, estava sendo reduzido a um lugar chamado Brasa.
Os lugares imaginários costumam ser territórios do sonho. Mas estes são do pesadelo. O perigo é, ao acordar do pesadelo, descobrir que não estávamos dormindo.