No governo Lula prevalece um dos costumes antigos da técnica de governar no Brasil, a instabilidade. Podemos, mesmo, comparar os titulares do governo nos postos mais altos como a profissão de técnico de futebol. Ninguém está seguro. Do dia para a noite, o presidente, ouvindo um de seus conselheiros, despacha o titular de um cargo para casa. Já o fez até com um delegado do governo que se encontrava em Lisboa, para tratar de questões e problemas de governo para governo. Foi mandado embora pelo telefone.
Se, pois, não há segurança para titulares dos cargos mais altos do governo, assim como para os técnicos de futebol, é difícil encontrar quem se preste ao papel de pau mandado ou de bajulador, com o único fim de se manter num posto que é o primeiro a ser focalizado pelos holofotes da mídia. Se não há ninguém que resista a um convite para cargo ministerial ou afim, é exatamente por ser visível em permanência pela mídia, que o enaltece, até o dia em que deve deixá-lo de lado, por não mais interessar.
Agora temos o caso do presidente do BNDES, que foi despachado para casa, e logo o seu lugar foi ocupado por um titular que está de bem com a cúpula que cerca o presidente Lula e o aconselha. Até mesmo frei Beto, o assessor especial de Lula deixou de sê-lo, por iniciativa própria, mas, na realidade, o fez para não ser também despachado um dia ou outro, fundo o humor do presidente ou de seus mais chegados colaboradores na técnica de governar num país de insegurança geral como é o Brasil.
Evidentemente, diz-se, para justificar as demissões, que o presidente se decide, exclusivamente, pensando no Brasil. Conversa. O presidente se decide por motivos vários, entre eles o de interesse público. Mas, na maioria das vezes, por outro motivo, inclusive por não "ir com a cara" do titular por ele mesmo escolhido e nomeado. Daí a instabilidade, que, no tempo de Getúlio Vargas, era o seu cemitério particular, onde ele enterrava e desenterrava quem ele ou não ia com a cara ou precisava do lugar para outro. Enfim, no governo não há segurança, como nos campos para os técnicos de futebol. É a realidade.
Diário do Comércio (São Paulo) 29/11/2004