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A grande farra

 

Reclamam do cronista o pessimismo em relação à democracia representativa como ela vem sendo exercida em quase todo o mundo, sobretudo no Brasil, onde não há partidos que representem qualquer coisa. No passado, o PCB e, até bem pouco tempo, o PT eram exceções relativamente tíbias, mas funcionavam: sabia-se quem e o que pensavam e queriam os que votavam nos dois partidos.


A verticalização, rejeitada nesta semana na Câmara dos Deputados, seria um remendo, um band-aid, não criaria nem fortaleceria nenhum partido, mas daria alguma decência e sobretudo coerência ao ato de cada cidadão votar. Mais: seria uma forma até certo ponto institucional de impedir a farra do boi em que cada eleição se transforma, escancarando o curral para toda sorte de bandalheira na hora de formar alianças pelo Brasil afora - eixo em torno do qual nasce e cresce a corrupção eleitoral.


Para ficarmos na recente e ainda não apurada onda de escândalos: a maior parte do dinheiro sujo que o PT obteve fraudulentamente de caixas dois e de doações suspeitas, possivelmente até de fora do país, foi para pagar dívidas de campanha, as suas e as dos outros partidos que a ele se aliaram em nível estadual ou municipal.


E esta é a parte mais desculpável da farra. Limita-se ao dinheiro da campanha em si. O pior é a falta de substância de cada partido, que, pensando desta ou daquela forma para ter mais voto, topa qualquer promiscuidade com partidos que pensam diferente e operam com outros critérios.


Não se trata de saber quem está certo ou errado. Um partido contra a reforma agrária, por exemplo, não poderia apoiar um partido a favor da reforma no campo e muito menos receber dinheiro do mais forte para vencer em algum município/Estado.


É o óbvio. Óbvio que a classe política acaba de rejeitar e, mais cedo ou mais tarde, irá se chafurdar mais ainda na lambança da corrupção e do descrédito.


 


Folha de São Paulo (São Paulo) 28/1/2006