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FLA X FLU idiota

 

A massa de leitores é, por natureza, heterogênea e conflitante entre si. Ao contrário de outros produtos industriais ou comerciais, a leitura dos jornais não chega a ser item indispensável, como o arroz ou o feijão. Mesmo no caso do arroz e do feijão, são infinitas as variedades servidas na mesa do brasileiro, há diversos tipos de arroz e de feijão (preto, manteiga, mulatinho etc.) e também são infinitas as maneiras de prepará-los, desde a feijoada, no caso do feijão, ao risoto de frango, no caso do arroz.


Leio cartas de leitores a mim endereçadas e a outros cronistas da praça com reclamações muitas vezes truculentas, acusando-nos de lulistas ou de fernandistas, de acordo com críticas que fazemos e até mesmo quando deixamos de fazê-las.


Clóvis Rossi e eu, para dar dois exemplos, somos alternadamente acusados em e-mails de defender os interesses de Lula ou de FHC. Se criticamos o atual presidente, somos considerados viúvas do segundo.


Tenhamos paciência. A lógica de Aristóteles, que não canso de citar, garante que a afirmação de uma coisa não é a negação de outra - "affirmatio unius non est negatio alterius". Se baixamos a lenha em Lula, não quer dizer que cubramos FHC com louros (não com papagaios, mais louros mesmo, os da glória).


Durante os oito desgraçados anos de FHC, fui acusado de lulista fanático e, embora tenha simpatias por ele, pessoalmente, sempre desprezei o PT, e por vários motivos. Quanto a FHC, cheguei a receber apelos de amigos muito caros e isentos para poupá-lo de minhas críticas, sobretudo quando, em parceria com o grande Angeli, a Boitempo publicou, em seleção feita não por mim, mas pela própria editora, um livro intitulado "O Presidente que Sabia Javanês", que tirou algumas edições.


Atribuir a jornais e a cronistas a torcida por tal ou tal candidato é, na melhor das hipóteses, ou má-fé, ou a humana e desculpável idiotice.


 


Folha de São Paulo (São Paulo) 9/2/2006