Mais uma vez a oposição está escolhendo o pior caminho na disputa sobre o rito do processo de impeachment, unindo-se ao (ainda) presidente da Câmara, Eduardo Cunha, nos embargos de declaração que serão impetrados para tentar mudar a decisão do Supremo Tribunal Federal.
A oposição questionará unicamente a proibição de haver chapa alternativa na eleição para a Comissão da Câmara que analisará a admissibilidade do processo de impeachment, baseando-se na afirmativa do Presidente da Câmara de que o artigo 19 da Lei º 1.079/1950 alude a “comissão especial eleita”.
No entanto, bastaria que lessem a íntegra do voto do ministro Luis Roberto Barroso para constatar que ele concluiu, e foi seguido pela maioria do STF, que a escolha dos membros da Comissão não é uma eleição, mas sim uma indicação dos líderes para Comissões Temporárias, conforme define o artigo 33 do Regimento Interno da Casa.
Por isso, aliás, o Supremo Tribunal Federal não aplicou o artigo 188 do regimento, que trata especificamente da votação secreta em eleições. Essa, por sinal, é uma controvérsia que o ministro Barroso esclareceu em um artigo no site Consultor Jurídico. Ele não considerou que o artigo 188 do regimento interno da Câmara pudesse ser utilizado, e mesmo assim o artigo não prevê voto secreto para todos os membros da comissão, mas apenas para os presidentes e vices:
“A votação por escrutínio secreto far-se-á pelo sistema eletrônico, nos termos do artigo precedente, apurando-se apenas os nomes dos votantes e o resultado final, nos seguintes casos: (...)
III – para eleição do Presidente e demais membros da Mesa Diretora, do Presidente e Vice-Presidentes de Comissões Permanentes e Temporárias, dos membros da Câmara que irão compor a Comissão Representativa do Congresso Nacional e dos dois cidadãos que irão integrar o Conselho da República e nas demais eleições”.
Foi por isso também que o ministro Teori Zavascki, que o havia questionado, admitiu que Barroso estava com a razão nesse caso. A Constituição, no seu artigo 58, diz que as Casas do Congresso formarão comissões com base no seu regimento, e o artigo 33 do regimento interno da Câmara explica como serão constituídas as comissões temporárias, como é a do impeachment: seus membros serão “designados pelo Presidente por indicação dos Líderes”.
No seu voto, Barroso diz acreditar que o artigo 19 da Lei 1.079/1950 foi superado pelo artigo 58, caput e § 1º da Constituição. O raciocínio é lógico: se a Constituição determina que comissões temporárias serão formadas de acordo com o regimento interno da Câmara, e se a comissão do impeachment é uma comissão temporária, fica claro que o artigo da lei de 1950 que determina que a comissão seja “eleita” caducou.
Barroso ainda se esforça para interpretar o espírito da lei, dizendo que “eleita” significa apenas escolhida, de maneira que a formação da comissão de impeachment seguiria, por completo, o regramento padrão do Regimento Interno da Câmara. “Não pode caber ao Plenário da Casa Legislativa escolher os representantes dos partidos ou blocos parlamentares. Logo, eleita significa escolhida, que é, aliás, uma das acepções léxicas possíveis”.
E, mesmo assim, para seguir os mesmos critérios usados no impeachment do ex-presidente Collor, o ministro Barroso admite em seu voto a realização de eleição pelo Plenário da Câmara, desde que limitada a confirmar ou não as indicações feitas pelos líderes dos partidos ou blocos, isto é, sem abertura para candidaturas ou chapas avulsas.
Isso por que, explica o ministro Barroso, “se, por força da Constituição, a representação proporcional é do partido ou bloco parlamentar, os nomes do partido não podem ser escolhidos heteronomamente, de fora para dentro, em violação à autonomia partidária”. Fica aberta a interrogação sobre o que fazer se o plenário da Câmara não aprovar a lista apresentada pelos líderes partidários.
Barroso sugere uma solução em seu voto: “Pode haver, por certo, disputa dentro do partido, e pode até ser saudável que se façam eleições internas.” A saída da oposição será mais eficiente, portanto, se estimular chapas dissidentes nos partidos aliados, tentando superar na disputa interna os governistas.
O sucesso da dissidência dependerá também da situação econômica do país na ocasião da escolha da Comissão da Câmara, que é onde se dará a disputa essencial. Caso a Câmara aprove por 2/3 a admissibilidade do impeachment, não haverá clima político para o Senado reverter essa decisão.
Se a oposição não for bem sucedida nessa empreitada na Câmara, será sinal de que o governo ainda tem argumentos, republicanos ou não, para manter sua maioria preventiva.