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A esperança de vida, e a vida da esperança

 

“A idade máxima atingida por um ser humano é de 122 anos. Mas dá para viver mais do que isso? Até recentemente, acreditava-se que não, que nosso relógio biológico pararia por volta de 90 anos. Hoje, há dúvidas, mas, de qualquer modo, admite-se que a eternidade ainda está longe”.


Matusalém, conta-nos a Bíblia, viveu 969 anos. E ele não é o único longevo citado no Antigo Testamento; seu neto Noé, aquele da arca, quase chegou lá: morreu com 950 anos. Tinham esses patriarcas descoberto o elixir da longa vida, que os alquimistas depois tanto procurariam? Não. Mais lógico é concluir que sua aparente longevidade resultava de um modo diferente de calcular o tempo. Mas longevidade não deixa, contudo, de provocar a nossa inveja. Durar muito e, melhor ainda, ser imortal é um sonho que no fundo todos acalentamos e a denominação de imortais dada aos membros da ABL reflete essa fantasia, que não arrefece nem mesmo quando surgem vagas na Academia.


O nosso tempo de vida é limitado. A idade máxima atingida por um ser humano é de 122 anos, melhor que a do cavalo (62 anos), do gorila (39 anos) e do cachorro (34 anos). Mas dá para viver mais do que isso? Até recentemente, acreditava-se que não, que o nosso relógio biológico irremediavelmente pararia por volta de 90 anos, um pouco mais, um pouco menos. Hoje, há dúvidas sobre isso, mas, de qualquer modo, admite-se que a eternidade ainda está longe.


Existe um indicador que serve para avaliar a duração da existência. É a expectativa de vida, um número que responde à pergunta: quantos anos alguém pode esperar viver, em média, num determinado lugar? Esse “em média” é importante. No passado, a expectativa de vida era muito baixa, porque a mortalidade infantil, isto é, o número de crianças que morriam antes de completar um ano de vida era alto, e isso puxava a média para baixo. Mas a mortalidade infantil tem diminuído, e além disso as pessoas estão de fato vivendo mais: porque se alimentam melhor, porque moram melhor, porque têm mais acesso aos cuidados de saúde. E isso é o que acontece em nosso país: a expectativa de vida do brasileiro ao nascer passou de 71,9 anos em 2005 para 72,3 anos em 2006, segundo informa o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Em relação a 1960, a expectativa de vida, que era então de 54,6 anos, cresceu 32,4%. De acordo com os dados de 2006, a expectativa das mulheres era de 76,1 anos; e dos homens, 68,5 anos. Por que essa diferença, se a mulher é tradicionalmente considerada sexo frágil? Porque o homem paga um tributo maior às doenças cardiovasculares, que são grande causa de morte e também por causa das mortes violentas (homicídios, acidentes) que causam muito mais vítimas no sexo masculino.


Alguém poderia dizer que, com os progressos científicos, o aumento da expectativa de vida aconteceria de qualquer maneira. Mas não é bem assim, e há um exemplo constantemente citado: o da antiga União Soviética que, durante o período de derrocada do comunismo e de transição para uma economia de mercado, passou por uma sombria crise social e, conseqüentemente, por uma crise de saúde. Na Rússia, a expectativa de vida que era de 65 anos em 1987 caiu para 58 anos em 1994. Essa queda foi atribuída ao alcoolismo, que então cresceu muito, às mortes violentas, e também ao aumento da mortalidade por doenças cardiovasculares, freqüentemente ligadas a um estilo de vida pouco sadio e muito dependentes de cuidados médicos.


No Brasil, isso não aconteceu: a expectativa de vida cresce sem cessar. Mas ainda não chegou aos níveis do Japão (81,4 anos para ambos os sexos), da Suécia (80 anos), da Espanha (79,8 anos) ou da Finlândia (78,7 anos). Estamos mais ou menos juntos com o Egito e a China. Ou seja, estamos melhorando, e isto vale para outros indicadores, como a mortalidade infantil, que vem caindo no Brasil. Temos de nos preocupar agora é com o ritmo da melhora, que precisa ser acelerado. Os números não são apenas números, são vidas. Melhorar rapidamente os números é salvar gente. E é por isso que o investimento na saúde é urgente e prioritário.


Correio Braziliense (DF) 7/12/200