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Encontros sociais

 

RIO DE JANEIRO - "Diante de dois imbecis desconhecidos, eu me torno mais imbecil do que eles." Li essa frase num velho almanaque no tempo em que havia almanaques, que funcionavam mais ou menos como o Google de hoje. Eles ensinavam o melhor modo de tirar manchas dos brocados, do melhor mês para plantar mandioca e lembravam que Agripina morreu no ano 59 da era cristã.


Eram informações inúteis para mim, não sabia o que era brocado, não pretendia plantar mandioca e poderia passar a eternidade inteira ignorando a morte da mãe de Nero. Mas a frase relativa à imbecilidade dos desconhecidos e da minha própria imbecilidade, nunca a esqueci, não sei se era de Anatole France ou de Edmond Goncourt. Não importa a autoria: ela se aplicava ao meu caso e acredito que ao de muita gente.


Nada mais constrangedor numa reunião social do que o encontro de duas ou três pessoas que se ignoram mutuamente. Podem ser gênios em suas respectivas áreas, homens de ilibada virtude e profunda sapiência. Mas, ao contato com pessoas estranhas, funcionam como débeis mentais, aprovando por cortesia todas as afirmações emitidas e concordando com as opiniões que nenhum deles na verdade defendem.


Por desgraça do destino, sendo eu um animal pouco sociável, sou vítima freqüente desses encontros dos quais saio geralmente com mais dois desafetos. Semana passada, exagerei no meu azar. Após uma cerimônia num desses espaços culturais que transformam uma garagem em auditório, fiquei frente a frente com dois desconhecidos que já conhecera antes, numa reunião semelhante. Vagamente, eles se lembravam de mim, mas o mesmo não acontecia comigo. Tive a indelicadeza de aludir, genericamente, aos imbecis desconhecidos. Um deles discordou: "Piores são os conhecidos imbecis".


Folha de S. Paulo (SP) 1/5/2008