As agências reguladoras foram criadas em consequência da privatização de setores da economia no governo Fernando Henrique Cardoso. A ideia central é haver agências independentes para garantir que as empresas privatizadas cumpram bem suas missões em todo o território nacional. Por isso elas têm mandato para o presidente e diretores, que não coincidem com os de governos eleitos.
Normalmente, um dirigente de agência reguladora é nomeado por um presidente da República, e seu mandato entra pelo governo que lhe sucedeu. No caso de reeleição, é possível que os mandatos coincidam em algum momento, mas a autonomia continua preservada pelo mandato fixo. Os governos petistas nunca gostaram da ideia, consideram que os ministérios ficam esvaziados.
O problema básico é que o PT sempre politizou as agências reguladoras, seja nomeando diretores de sua confiança política, não necessariamente técnicos, seja considerando os que lá estavam, de governos anteriores, não como técnicos, mas infiltrados dos partidos adversários. O mesmo comportamento que tiveram com o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, nomeado no governo Bolsonaro. A desconfiança de Lula e de seu entorno sobre o presidente do BC, o primeiro presidente com autonomia também aprovada na gestão Paulo Guedes, fez com que a disputa em torno dos juros roubasse tempo da gestão econômica.
Um dos papéis mais importantes de seu sucessor, Gabriel Galípolo, indicado por Lula para substituir Campos Neto, será demonstrar na prática que técnicos como ele e seu antecessor não atuam politicamente. As agências foram perdendo força — no governo Bolsonaro foi a mesma coisa. O sentido das agências, proteger o cidadão num sistema privatizado, se fragilizou nesses governos com tendências autoritárias, que querem controlar tudo. As agências deveriam ser independentes. É uma disputa grande entre governos autoritários e um sistema independente de regulação.
Há anos, portanto, as agências reguladoras vêm sendo esvaziadas e preenchidas por escolhas políticas, quando têm função puramente técnica. Essa é uma das razões para a falta de fiscalização apontada como causa das falhas constantes da concessionária Enel na distribuição de energia em São Paulo quando há fortes tempestades, o que vem acontecendo com frequência cada vez maior devido à crise climática.
Para o prefeito Ricardo Nunes, que disputa a reeleição, a crise de energia em São Paulo não poderia ter acontecido em pior momento. Uma cidade com falta de luz durante dias é um prato cheio para a oposição, embora a prefeitura seja a que menos tem culpa nessa situação (mas é difícil negar que também tenha). A falta de uma política de poda das árvores mais efetiva é uma delas.
Uma das decisões que têm de ser tomadas na renovação dos contratos é a obrigação de as concessionárias colaborarem com os governos locais para enterrar os fios elétricos, para evitar que a queda de árvores e postes afete a distribuição de energia. É uma medida cara, cujo custo deve ser compartilhado. O governo da cidade do Rio, que teve um início promissor na prefeitura de Cesar Maia, propôs esse compartilhamento, mas a concessionária não aceitou e entrou na Justiça, inviabilizando o reinício das obras. A responsabilidade é federal. Ministério de Minas e Energia e as agências reguladoras deveriam ser os mais criticados.
Por esses paradoxos da política, o próprio governo do PT tenta usar o apagão para enfraquecer o prefeito, a favor de Guilherme Boulos no segundo turno. Não creio que mudará votos a ponto de dar a vitória à oposição, mas acredito que afetará a performance do prefeito e dar uma melhorada boa para o candidato de esquerda.