Desde que Elon Musk, o homem mais rico do mundo, anunciou seu interesse pelo controle do Twitter, Bolsonaro e seus seguidores comemoram, dando à transação comercial uma conotação política de favorecimento à liberdade de expressão, o que agrada ao bilionário, que tem uma visão bastante libertária do que isso seja. Tanto que pretende reabrir as contas do ex-presidente Donald Trump, que se utilizou das redes sociais, especialmente o Twitter, para insuflar a invasão do Capitólio para impedir que o Congresso americano validasse a vitória do democrata Joe Biden na eleição presidencial de 2020.
“Um sopro de esperança”, disse Bolsonaro a respeito do projeto de Musk de abrir o Twitter indiscriminadamente, sem barreiras. O que parece ser uma atitude democrática, nada mais é do que o apoio a estratégias internacionais da extrema-direita de uso das redes sociais para atuação política. A presença dele no Brasil, portanto, tem a ver com uma visão política deturpada do que seja liberdade de expressão, ficando os negócios como efeitos colaterais de um apoio ostensivo à reeleição de Bolsonaro. Monitorar a Amazônia interessa a Musk, na busca de metais como níquel, lítio, nióbio para sua empresa de carros elétricos Tesla e para o Space X.
Enquanto Musk, com seu jeitão de vilão de James Bond, vai literalmente para o espaço, aqui na Terra há movimentos internacionais contra a segurança do sistema eleitoral, que têm tem sido utilizados pela extrema-direita em vários países, independentemente se o voto é eletrônico ou em papel. A equipe de pesquisadores independentes que integram a “Democracia em xeque”, que auxilia o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no acompanhamento das redes sociais, constatou nos últimos meses que a campanha de Bolsonaro nas redes para desacreditar as urnas eletrônicas passou a novo estágio, com a instrumentalização das Forças Armadas. Os bolsonaristas migraram sua narrativa sobre um possível hackeamento das urnas eletrônicas, pois o argumento do TSE de que elas não são conectadas à internet a enfraqueceu, e migraram para outra, que busca gerar desconfiança direta sobre o papel do Tribunal na totalização dos votos.
Vivemos há anos um cenário de crise política, no qual os brasileiros não confiam nas instituições. Por mais que esse dado seja recorrente na história brasileira, nos últimos anos piorou consideravelmente. De acordo com a pesquisa “A cara da democracia” feita em 2020 pelo Instituto de Defesa da Democracia (IDDC), 66,9% dos consultados falaram que não confiam em partidos políticos, 37,3% não confiam no Congresso Nacional, 47,8% não confiam no presidente da República.
As instituições de que os brasileiros menos desconfiam são o Judiciário e as Forças Armadas, e no cabo de guerra entre as duas, os militares ainda têm menos desconfiança por parte dos cidadãos. Os dados apontam que enquanto 21% dos brasileiros não confiam no Poder Judiciário, só 16,1% não confiam nas Forças Armadas. Assim, os bolsonaristas buscam usar a legitimidade que elas têm perante a população como forma de respaldar sua campanha para desacreditar o sistema de Justiça (STF/TSE).
Ocorre que esta instrumentalização, através de milhares de postagens e milhões de visualizações nas redes sociais, ao mesmo tempo em que alimenta a narrativa bolsonarista, acaba por reforçar uma imagem de partidarização das próprias Forças Armadas em parcelas da população, por estarem cada vez mais envolvidas na política, contribuindo assim para o seu desgaste enquanto instituição de Estado, independente e, principalmente, acima do jogo político, que é em grande parte o que garante sua credibilidade.
Esta é a Estratégia e o marco narrativo do bolsonarismo, segundo os pesquisadores:
1. As urnas falham: se mantém a ideia do “manto de desconfiança”, daí a necessidade de algum tipo de “auditoria” dos votos, para dar maior transparência;
2. Pesquisas manipulam: o que funciona é “datapovo” e pesquisas “internas”
3. A imprensa mente: o que funciona são redes sociais e canais amigos (JovenPan, Pingo nos is, entre outros)
4. A sala escura é prova da falta de transparência: TSE age com “sigilo e falta de transparência”
5. Atiçam de forma permanente a indisposição das FFAA com Ministros do STF/TSE: TSE não tem porque não “atender sugestões das FFAA”
6. Fulanizam ataques contra ministros: “Fachin agride FFAA”; “Moraes persegue Bolsonaro, o comandante em chefe das FFAA”
7. Defendem o Artigo 142 da Constituição Federal como mecanismo que permitiria acionar as Forças Armadas como "poder moderador" no caso de uma crise institucional entre os poderes.
8.O TSE e “meia dúzia” de funcionários teriam acesso a chamada “sala secreta” ou “sala escura”, resultando na proposta de Bolsonaro de “conectar o computador do TSE ao do Exército, para uma apuração paralela em tempo real”.