Os comentários sobre a eleição de Severino Cavalcanti para a presidência da Câmara dos Deputados estão fervilhando. O dono, segundo a mídia, do baixo clero, faz lembrar a Revolução Francesa. Entre tantas traições, atitudes desencontradas de outras, na condução dos acontecimentos, o baixo clero não votou com o primeiro Estado, o clero, nem com o segundo, a nobreza, mas com o Terceiro Estado, o povo, entendida a palavra como todos os que não pertenciam a um dos dois outros Estados da representação. Severino Cavalcanti, um dos milhares de Cavalcantis ou Cavalcantes do Nordeste, principalmente de Pernambuco, soube dominar o baixo clero.
Na Câmara dos Deputados, o astuto pernambucano, que até parece ter nascido em Minas Gerais, terra dos bons políticos, dos políticos que sabem fazer política e saírem-se vencedores na refrega, o astuto pernambucano ganhou por grande maioria, enquanto o candidato da maioria, do PT de Lula, perdia e perdia feio. A Câmara dos Deputados, até onde temos a pretensão de lembrar com a memória já gasta pelos anos, nunca teve um presidente da categoria de Severino. O cargo é da maior importância. Impõe, a quem o exerce, autoridade, entendida a palavra pelo respeito que todos os membros da Casa devem ter por sua presença na mesa dos trabalhos e nas decisões que são tomadas no suposto interesse do povo. Severino não conta com esse atributo.
O poder continua, portanto, nas mãos de Lula e seus agregados, agora com o direito a nomearem mais de oitocentos assessores, não se sabe fazerem o que na Câmara senão alguns discursos mambembes aos ora seus chefes. A assessoria é uma função hoje em dia necessária, pois na maioria os deputados são pessoas de poucas letras, alguns de nenhuma. Mas, na verdade, aproveitemos o uso das abreviaturas, e chamemos esses assessores de aspones, porquanto, na verdade, são de coisa nenhuma, senão de receberem o salário no fim do mês.
O PT, que sempre criticou a burocracia, os trens de alegria, agora vai ter de nomear assessores para se por em dia com as promessas aos correligionários. Enfim, o poder faz o que entende e ninguém o impede, embora estejam vigentes instituições como o STF, o STJ, Tribunal de Contas da União, e vários organismos com funções morais. Nada, no entanto, é feito para moralizar a política brasileira.
A mídia, no entanto, vai ajudar Lula, pois fez publicar em manchetes a melhor arrecadação, deixando as nomeações dos aspones para colunas menores do jornalismo, para um ou dois minutos na televisão, e assim por diante, que este é o país das patacas de ouro, tanto cumula os aspones com bons salários. O fato é que a democracia praticada no Brasil é assentada em mentiras, em falsas afirmações, em presidentes de Câmaras de Deputados que nada entendem do poder.
Pois é disso que tratamos, da falta de autoridade de Severino para comandar uma Casa de membros pouco sujeitos a mandos, a afirmações desmentidas, a promessas de punição nos deputados vadios e assim por diante. Esperem os leitores para ver que Severino Cavalcanti vai fazer uma associação com Lula ou com os chefes petistas, como Genoino, Dirceu e outros. É de sua natureza. Nada pode ser feito para mudá-lo.
Diário do Comércio (São Paulo) 04/03/2005