Constatada a decadência de nossa democracia representativa, um fenômeno que não se restringe ao Brasil, mas que tem características próprias de nosso modelo político-eleitoral, quais soluções se apresentam para minorar os problemas que enfrentamos?
Parece haver uma confluência entre os especialistas sobre a inadequação de nosso sistema eleitoral, e a necessidade de haver uma contenção do número de partidos que possam integrar o Congresso. O voto proporcional levaria a distorções pelo voto de legenda e as coligações proporcionais.
O sociólogo Francisco Weffort crê que a grande influencia na decadência da representação tem a ver com a permanência do sistema eleitoral de representação proporcional de voto com lista aberta. “Este método eleitoral tornou-se incapaz de funcionar adequadamente em um país como chegou a ser o Brasil, de enorme população eleitoral e de extraordinária diversidade regional”.
Nosso federalismo é extremamente desequilibrado, analisa Weffort. “Nas circunstancias da lei atual, temos alguns deputados com muitos milhares de votos, em geral eleitos em grandes estados, e muitos outros com alguns poucos milhares de votos, eleitos em pequenos estados ou, mesmo em grandes estados, com as sobras “de legenda”.
Tudo se complica, diz ele, quando se examina a representação no Senado, levando em conta que é igual o numero de senadores por estado. E o que é pior, os senadores contam com suplentes que, sem votos próprios, esvaziam ainda mais o sentido da representação.
Francisco Weffort acredita que seria preciso mudar o sistema eleitoral para um regime de voto distrital, “segundo o exemplo inglês ou, talvez melhor, o exemplo alemão”. Para os partidos haveria que admitir alguma formula de barreira, pelo menos quanto à representação parlamentar, ao fundo partidário e à propaganda gratuita na TV. “Seriam medidas no caminho de aproximar o representante dos seus representados e de diminuir os custos das campanhas eleitorais”.
Weffort diz que o uso do recall seria importante, e não descarta a possibilidade de usar o voto distrital, que sugere o sistema parlamentarista, com o presidencialismo ao estilo americano ou com as modificações do estilo francês.
O cientista político Nelson Paes Leme chama de “absurdo” o modelo de eleição que adotamos, tanto no voto proporcional para a Câmara dos Deputados quanto no majoritário para o Senado, e os vê como os mais diretos e imediatos motivos dessa baixíssima qualidade.“No voto proporcional para a Câmara, temos a aberração do voto de legenda, analisa ele. Mas há outros tumores localizados, ressalta, como a pluralidade “absurda e incontrolável de legendas inideológicas e aprogramáticas por natureza e essência”.
Ele culpa também os subsídios partidários obrigatórios, como a lei da propaganda eleitoral. No voto majoritário do Senado também cita “a aberração extra desses suplentes familiares, esposas, filhas, filhos e irmãos, que assumem cadeiras estaduais importantíssimas na Câmara Alta sem terem tido um único voto, consolidando uma representação primitiva, hereditária e feudal”.
Também o critério de representantes por unidade no Senado é totalmente distorcido do princípio de freios e contrapesos, diz ele. Mas talvez o pior de todos os problemas, na opinião de Paes Leme, seja a distância dos eleitos em face do eleitorado que os elegeu por esse sistema em país continental como o nosso.
“Distância física e política, porque a não existência do distrito federado e do voto distrital misto, como na maioria dos países europeus e no Japão, ou das exaustivas prévias regionais norte-americanas, fazem com que o representante seja um solene desconhecido, um quase estranho para o eleitor que muito raramente tem a oportunidade de sequer apertar-lhe a mão, mesmo em raras campanhas quadrienais, do seu eleitorado”.
O cientista político Jairo Nicolau, especialista em sistemas eleitorais, chama a atenção para alguns dados específicos de pesquisas de comportamento do eleitor, que certamente refletem esses problemas. “Poucas semanas depois das eleições, metade dos eleitores já não lembravam como tinham votado para deputado federal ou estadual. Estes números são bem maiores do que esquecem da escolha que fizeram para governador e presidente”.
Outro tópico é a relação entre preferência por um partido e voto para deputado federal e estadual. O número de total de eleitores que votam no mesmo partido que preferem é de cerca 5% para os dois cargos. A convergência entre voto para deputado federal e voto para presidente é de cerca de 25% do eleitorado total, isto é, cerca de 1/3 dos eleitores fez escolhas incongruentes, votaram em candidatos para deputado federal de partidos que não compunham a coligação presidencial.