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Democracia à brasileira

 

O vaivém do TSE, no mudar ou não as regras do jogo das eleições, insiste no refogado que o Brasil bem brasileiro que vai às urnas a 2 de outubro. E o que representa esta louvada humildade do magistrado Marco Aurélio frente à palavra dos barões do sistema, do que seja, na sabedoria final, a nossa realpolitik? Quem o poderia fazer mais que o ex-presidente Sarney que assumiu a tarefa do abstrato Conselho da República, ao cuidar das ameaças à democracia e às instituições do país. Mesmo porque é do que se trata, neste contraste do sistema de fato com o nosso Estado de Direito agravado pela crise do mensalão.



As instituições, no seu corpo mesmo, são reptadas pela tensão em que o status quo cada vez mais experimenta o divórcio entre a ordem social estabelecida e imediata e o decantado, e sempre reposto à liça, desenvolvimento nacional. Mas, de concessão em concessão, ainda agora, a litania das Comissões de Inquérito asseguraram a mais tranqüila conservação do sistema oligárquico clientelístico, para comandar o processo político do país. De absolvição em absolvição, consagrou-se a continuação do "caixa 2" como mola das eleições e do nosso sistema representativo. Nada, afinal, de abalo ao valerioduto que corre democraticamente - e o continuará - no subsolo dos sucessos políticos e na negociação, pela verba dos governos entrantes, garantida pela operação eleitoral.



Alargou-se o fosso confessado entre a pregação das reformas trazidas a crassa nudez das ideologias, e de como continuará no futuro - e através de emenda constitucional - o regime que aí está. Ao freio temporário da verticalização não foi dada, sequer, a alegria de um verão eleitoral, diante do facilitário já consagrado para 2010. Nem logrou o arreganho do presidente do TSE, afinal, assegurar-nos uma prévia de esperança no lance natimorto de como seria um regime de consonância nacional, de alianças sem transigência. O recado incômodo ao futuro cancelou-se pelo bem bom de todas as farras e farranchos desde já, a que se associou o governo frente ao vale-tudo, de como continuarão as eleições após o segundo mandato de Lula. Nem, após esses dias do perdão final, virá a prosperar qualquer final propósito punitivo nas Comissões de Inquérito, para além do escarmento de Dirceu e Jefferson, e o castigo, contra a vontade real dos plenários, dos que, pelas confissões pregressas, puseram a corda ao pescoço para a cassação sem saída e de todo ranger de dentes.



De toda forma, e a seguir ao mensalão e ao processo aos sanguessugas, a nova catadupa de suspeições de prevaricação parlamentar pelo Ministério Público já ganham mais um ar de litania na consciência da impunidade que continuará, no à vontade da disputa, das próximas eleições.



Que poder, afinal, é este, no centro da praça de Brasília, que merece ser profanado pela invasão do velho peleguismo, renascido dentro dos movimentos sociais, como a última praga em que a militância se profissionaliza para quebrar os vidros do Salão Verde? Serviu o pontapé para mostrar a carranca de radicais jubilados na aposentadoria de todas as facécias, renegadas pelo MST que sabe a que vem e o que tem que fazer. O pior, no banimento da utopia, é a errância a que condena a radicalidade, ou a leva até à malandragem vândala.



O presidente Aldo Rebelo, neste jogo dos símbolos e dos portes que se pede aos titulares do poder teve o dom, já, de desenfatizar a tropelia de Bruno Maranhão. O que não pode resgatar é o Congresso como eixo da respeitabilidade do "a que veio" o Brasil trazido na ponta dos movimentos sociais. O susto de um Brasil diferente poderia ter saído do ensaio da verticalização tentado pela primeira decisão do ministro Marco Aurélio. Abortando-a, o TSE, afinal, antecipou, de vez, o Brasil do tudo bem, do "vale tudo" das eleições de 2010.


 


Jornal do Commercio (Rio de Janeiro) 07/07/2006

Jornal do Commercio (Rio de Janeiro), 07/07/2006