Se democracia é a convivência civilizada entre os contrários, ou seja, entre os que pensam diferente, o último fim de semana ofereceu um raro sinal positivo. Em quase todo o país, milhares de pessoas foram às ruas sábado e domingo, num movimento liderado por mulheres, manifestar sua oposição — #ele não — ou seu apoio — #ele sim — ao candidato Jair Bolsonaro. Diante do clima de hostilidade que vinha dominando a campanha eleitoral, com troca de ofensas e acusações mútuas, temia-se que as manifestações descambassem da violência verbal para a física.
Isso felizmente não aconteceu. Não se registraram incidentes. A polícia não forneceu o número oficial dos participantes em atos contra o candidato do PSL nos 26 estados e no Distrito Federal, e a favor nos 16 estados, mas as fotos não deixavam dúvidas quanto à maioria dos #ele não, inclusive nas 66 cidades do exterior onde ocorreram protestos.
Em São Paulo, manifestantes do #ele sim ocuparam a Avenida Paulista. No Rio, a Cinelândia, acostumada a abrigar multidões, raras vezes viu tamanha concentração, provavelmente a maior dos #ele não, e tamanha diversidade de tons de pele, de idades, de gêneros .
Mas nos mesmos dias em que os militantes tomavam conta das ruas, o Ibope ouvia 3.010 eleitores em 208 cidades sobre suas intenções de votos. O resultado foi surpreendente. Ao contrário do que o sucesso das manifestações contra Bolsonaro fazia crer, o candidato do PSL subia quatro pontos, ampliando em dez sua diferença: de 31% para 21% de seu mais próximo concorrente, Fernando Haddad, que ficou estacionado. A outra má notícia para os petistas foi a rejeição ao seu candidato, que disparou de 27% para 38%, enquanto a do deputado permaneceu em 44%.
Analistas e pesquisadores concordam em que nunca houve uma eleição tão confusa, tão difícil de ser prevista. E tão bizarra, dizemos nós. Os dois campeões de votos a favor são também os campeões de votos contra. Dito de outra maneira: os dois mais bem votados são também os mais rejeitados.