Dificilmente haverá, na história da América Latina, uma figura mais importante do que Simon Bolívar (1783-1830), o Libertador, líder político e militar venezuelano que, juntamente com José de San Martín, desempenhou papel importante na luta contra o domínio espanhol. Foi ele quem conduziu à independência Venezuela, Bolívia, Colômbia, Equador, Panamá e Peru.
Morreu relativamente cedo, de tuberculose, segundo a versão mais corrente. Afinal, seus pais haviam falecido da mesma, e muito comum, enfermidade; Bolívar tinha tosse, febre e emagrecimento acentuado, tudo compatível com esse diagnóstico. Mais importante, o cadáver foi necropsiado, e o laudo (ainda que à época não muito preciso) foi exatamente esse, de tuberculose.
Recentemente surgiram dúvidas a respeito, inclusive na área médica. O dr. Paul Auwaerter, da prestigiosa Escola de Medicina da Johns Hopkins University, aponta outros problemas de Bolívar que não tinham necessariamente a ver com tuberculose: dores de cabeça, artrite, queixas digestivas, escurecimento da pele. E levanta uma hipótese: Bolívar morreu de envenenamento por arsênico.
Bolívar não é a primeira figura histórica cuja morte gera polêmica. O mesmo aconteceu com Napoleão, exilado na ilha Santa Helena. E, curiosamente, suspeitava-se de que também nesse caso houvera envenenamento por arsênico, substância que foi encontrada no corpo do líder. Um crime político, cometido por inimigos de Bonaparte.
A ideia de que Bolívar tenha sido envenenado é apoiada por Hugo Chávez, presidente da Venezuela, que vê aí, igualmente, um crime político – cometido por um general colombiano. Como se sabe, Chávez tem uma já longa briga com o atual governo colombiano, agravada recentemente, quando o governo colombiano acusou Chávez de abrigar vários líderes das Farc na Venezuela. Chávez negou as acusações e, em sinal de protesto, chamou de volta a Caracas o embaixador venezuelano em Bogotá. Conclusão: a discussão sobre a causa da morte de Bolívar pode ter interesse não ser apenas histórico ou científico, mas também político.
No caso de Napoleão, concluiu-se que ele morreu de câncer do estômago. Quanto ao envenenamento por arsênico, diz um artigo publicado em Science et Vie (Ciência e Vida), ocorreu, mas não foi agudo: Napoleão deve ter absorvido o arsênico de produtos usados no cabelo e de outras substâncias. Em relação a Bolívar, diz o dr. Auwaerter, o envenenamento pode ter resultado de medicamentos com arsênico, então muito usados (ainda no século 20 tratava-se a sífilis com produtos arsenicais), ou mesmo de água contaminada.
Uma interessante discussão, do ponto de vista científico. Mas muito perigosa quando posta a serviço de objetivos políticos.
A Notícia Joinville (SC), 2/8/2010