RIO DE JANEIRO - Não venho acompanhando em detalhes a saia justa entre o pessoal da cultura, notadamente do cinema e do teatro, com o pessoal do esporte. Alguns setores da sociedade acham descabida a obrigação do Estado de sustentar ou apenas apoiar iniciativas culturais e esportivas.
Em tese, são manifestações que deveriam ser auto-sustentáveis, vivendo os esportes das bilheterias dos estádios e ginásios, o teatro e o cinema das respectivas bilheterias. Os altos custos tornam inviáveis a produção e a exibição de grandes realizações tanto num como noutro setor. De pires na mão, eles vão ao mercado em busca de patrocínios que, no fundo, serão bancados pelo Estado, que aceitará a renúncia fiscal em nome dos espetáculos: o pão e o circo custam caro.Sempre foi assim: a arte (o esporte não deixa de ser uma manifestação de arte) foi patrocinada pelos príncipes da Renascença e por grandes empresas que se beneficiavam da citada renúncia fiscal. A Renascença toda nasceu e frutificou graças ao apoio dos Médicis e dos papas, bastando citar Lorenzo, o Magnífico, e o papa Julio 2º.Não teríamos os afrescos da Capela Sistina se não fosse a obstinação do papa em subjugar Michelangelo, obrigando-o a trabalhar dia e noite, esquecendo-se inclusive de pagar o preço combinado pela encomenda.
Mais tarde houve a parceria de Luis da Baviera com Wagner e a estranha relação de Mozart com os príncipes-arcebispos de Salzburg, chegando a ponto de comer na mesa dos empregados e de ter levado, de um deles, um chute no traseiro.Não estou insinuando que Lula dê um chute no Barretão ou na Fernanda Montenegro. Pelo contrário, o governo tem obrigação de atender ambas as partes, a cultura e o esporte, ajudando a criar os valores que formam e sustentam uma nação.
Folha de S. Paulo (SP) 17/12/2006