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A crise e os sapos

 

Deixando de lado as miudezas dos escândalos que traumatizam a vida nacional, é hora de fazer um balanço, ainda que provisório, do governo de Lula e do PT, com a perspectiva de dois anos e meio de um mandato de quatro -o que já é bastante.


Falei em miudezas. São muitas e na realidade nem chegam a ser miudezas, uma vez que estão expressadas em milhões de reais envolvendo políticos que se apresentavam à nação como vestais. Breve cairá sobre o assunto a monotonia dos atos e fatos repetidos à exaustão, variando nomes e quantias, mas com o mesmo chassi -do qual ninguém duvida, nem mesmo os acusados. A continuar assim, mais algumas semanas, e com exceção dos mais exaltados, o grande escândalo ficará chato, embora continue escândalo -e dos grandes. Não é apenas a política que obriga seus praticantes a engolir sapos. De certa forma, o povo também habituou-se a engolir sapos, desde a mais remota Antigüidade. E às vezes engolia mesmo, sem metáfora nenhuma, como aquelas tribos que comiam coisas piores boiando nos rios da Babilônia.


Todos sabemos, agora, que a única novidade possível, o rumo único que poderá mudar a história do nosso tempo, não está confinada a Valérios, Delúbios, Silvios etc. Dá-se um doce a quem, sem pertencer às entranhas do PT, sabia da existência deles, o que faziam ou deixavam de fazer.


Queiramos ou não, por maiores que sejam a admiração e o respeito que a nação tem pela pessoa e pela biografia de Lula, é ele quem está em crise e em choque. Não lhe adianta pedir trabalho aos ministros, tirar fulano daqui para botar ali, prometer cortar na própria carne. Ele terá de fazer qualquer coisa, não sabemos o quê. Mas Valérios, Delúbios, Silvios e outros só existiam porque estavam a seu lado, existiam por causa dele. É o preço que Lula deverá pagar pela sua liderança e pelo seu carisma.




Folha de São Paulo (São Paulo) 26/07/2005

Folha de São Paulo (São Paulo), 26/07/2005