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Confronto inédito

 

Mesmo que não se confirmem os boatos de que pesquisas não divulgadas mostram resultados muito mais próximos de um empate técnico do que uma vitória folgada da presidente Dilma – hoje saem as últimas pesquisas do Ibope e do Datafolha –, nunca uma eleição brasileira nos últimos tempos teve tanta disputa quanto esta, que entra no fim de semana decisivo sem um vencedor claramente identificado.

Na melhor das hipóteses para o PT, a presidente Dilma será reeleita com uma votação menor do que a que o partido vinha tendo até 2010. E Aécio Neves, mesmo que não vença, deve ter a melhor performance de um candidato tucano nos últimos tempos, o que o credenciará como um líder incontestável de uma oposição que será muito mais aguerrida, pelas próprias circunstâncias da campanha atual.

O clima de agressividade que marcou a disputa, plantado no primeiro e elevado ao extremismo neste segundo turno, dificultará a conciliação nacional, e certamente precisaremos de um governo com legitimidade para levar o país adiante em meio a previsíveis crises institucionais, estas mais graves ainda, pois turbinadas por problemas econômicos que somente os que acreditam no mundo cor de rosa do marqueteiro João Santana desconhecem.

E o país que sairá das urnas estará irremediavelmente dividido. A legitimidade de um eleito não se deve apenas ao número de votos que teve nas urnas, mas à maneira com que os conquistou. Esta sem dúvida será a mais rasteira das campanhas eleitorais dos últimos anos, só comparável com a que elegeu Collor em 1989. Não à toa ele teve o fim que se sabe, pois alcançou a vitória usando manobras baixas, e não conseguiu nunca mais se aprumar como um presidente respeitável.

A começar pelo estelionato eleitoral caracterizado pelo confisco da poupança dos brasileiros, que ele acusava Lula de premeditar. Na eleição de 2002, o candidato derrotado do PSDB José Serra fez um discurso de despedida onde marcou com a expressão “estelionato eleitoral” o primeiro governo Lula, vencedor naquela eleição depois de ter perdido quatro eleições seguidas para Collor e Fernando Henrique.

Os eleitores petistas naquele ano, que acreditavam em grandes mudanças na economia, foram realmente enganados, pois Lula adotou práticas ortodoxas na economia e seguiu à risca o receituário do governo tucano, até mesmo nomeando para o Banco Central Henrique Meirelles, um banqueiro internacional eleito deputado federal naquela eleição pelo PSDB.

Mas aquele parecia ter sido um estelionato “do bem”, pois o PT abriu mão de teses radicais como o calote da dívida externa para colocar o país no rumo do crescimento. No segundo governo, quando a hoje presidente Dilma assumiu o Gabinete Civil em lugar de José Dirceu, em meio ao escândalo do mensalão, o PT retomou aos poucos suas teses econômicas, aprofundadas pela troca do ministro Antonio Pallocci por Guido Mantega.

Um novo estelionato eleitoral está sendo montado agora caso a presidente Dilma se reeleja amanhã. Sua campanha esconde o fato de que a crise econômica está se agravando e que terá que adotar medidas amargas para que o país não perca seus fundamentos e não se veja novamente às voltas com uma inflação sem controle e uma economia estagnada.

Mesmo os programas sociais que são o sustentáculo de sua votação correrão perigo com a economia sem produzir riqueza para ser distribuída. O aumento real do salário mínimo, por exemplo, depende por lei do crescimento econômico dos últimos anos, e por isso não acontecerá em 2015.

A queda da desigualdade foi interrompida no último ano exatamente devido à falta de crescimento econômico, mas os números não foram divulgados para não manchar a campanha eleitoral, que mostra um país pujante que só existe na propaganda do PT.

Os últimos dias de campanha estão marcados por denúncias de práticas ilegais e imorais da militância petista, e acusações de tentativa de golpe por parte dos petistas, que atribuem intenções eleitoreiras à reportagem da revista Veja revelando que o doleiro Alberto Yousseff afirmou em sua delação premiada que a presidente Dilma e o ex-presidente Lula sabiam da corrupção na Petrobras e se beneficiaram dela em campanhas eleitorais. Caberá ao eleitor avaliar as informações ao seu dispor e decidir em quem votar. Só não é possível exigir-se que casos polêmicos não sejam julgados ou reportagens não sejam publicadas quando há eleição por perto.

O Globo, 25/10/2014