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Começa a política externa de Dilma

 

Ao receber o presidente Wulff, da Alemanha, Dilma Roussef deu os primeiros passos de uma política externa, na linha desenhada pelo governo Lula. Amadurecemos no último mandato esta quebra de uma velha geografia de centros e periferias, em que se reforçava, classicamente, a dominação americana transformada em hegemônica, nos anos subsequentes à queda do muro.
 
Num novo ressalto internacional, a autonomia brasileira vai, naturalmente, à constituição do bloco dos BRICS, e, fora do perfil, ainda há uma década, previsto para a globalização. Nosso País confronta-se aí a duas outras nações gigantes, a China e a índia, também voltadas, pela dinâmica de sua própria população, para uma política de desenvolvimento nacional. Desaparecem, nesse quadro, as velhas polarizações, com a clássica ascendência dos Estados Unidos ao lado do continente europeu, e até a crise financeira de 2008, voltados para a afluência e o progressismo do modelo neoliberal.

No que respondesse ao novo contexto externo, independentemente de blocos, marcou-se o governo Lula pela defesa do Irã, e pela busca da plataforma das Nações Unidas para discutir o equilíbrio nuclear no Oriente Médio, a partir da posse da bomba por Israel, e o condicionamento que impunha a toda a área à sua volta. Mas, sobretudo, a emergência brasileira no Oriente Médio reflete o aporte de nossas raízes históricas no Líbano e na Síria, na força de sua imigração, fora dos clássicos ocidentalismos colonizadores. Em aliança nova, junto à Turquia, o Brasil fez sentir esta posição, liberada da inércia dos pactos de Washington, e da envergadura meramente regional do nosso desempenho internacional. A força de Dilma, hoje, é a de encarnar essa nova etapa, a partir do conflito árabe e à busca dos regimes democráticos no Mediterrâneo africano, iniciados pelos plebiscitos de rua, em Túnis e no Cairo.   

Mais importante, inclusive, que a perspectiva frente a Teerã é a de reconhecer o Brasil o quanto as políticas de paz em toda essa região não podem ser o apanágio da Otan, como se hoje e na nova globalização se mantivesse o protetorado invisível das nações afluentes ocidentais, sobre todo o futuro do Oriente Médio. Aí está o vigoroso protesto da União Africana, na ação indiscriminada contra Khadafi, a que aqui se junta, agora, o da própria União Árabe.

O respeito a situações nacionais, como a da Líbia, envolve verdadeiras consciências coletivas emergentes à luta pela identidade recém-conquistada, e diante do perigo do retorno aos conflitos clânicos após o abate do regime de Trípoli. Doutra parte, como se viu após a derrubada de Ben Ali e Mubarak, toda região, na busca da democracia, sem verdadeiras políticas de consenso, vê a regressão do laicismo desses países e, quiçá, augurando um novo fundamentalismo islâmico, à base de partidos únicos, e da retomada obsoleta da revolução de Khomeini.

De toda forma, a palavra e a visão da presidente Dilma, a que se soma a da Turquia, é de frear a sofreguidão em que a Nato se transformou na promessa de todo 'restabelecimento da ordem', tantas vezes encoberto pelo álibi democrático - para, tão só, a restauração dos velhos status quo, e, sobretudo, do controle das riquezas do subsolo, fora das verdadeiras políticas nacionais de desenvolvimento.

À voz brasileira, apostando no longo prazo, só pode aproveitar a queda rápida dos intervencionismos da última década, no Afeganistão ou no Iraque, na sequência da evicção de Bin Laden, e dos focos do terrorismo pós-11 de setembro. O mundo, do direito de autodefesa da humanidade, disparada pela queda das torres de Manhattan, sai da "civilização do medo", tanto quanto reforça, de vez, o pluralismo de vozes, nesta globalização que não tem mais nada a ver com o bushismo, e as guerras preemptivas, num universo submisso das periferias.

 Jornal do Commercio (RJ), 13/5/2011