A questão ambiental ganhou definitivamente protagonismo na campanha eleitoral com a adesão de Lula a um programa apresentado por Marina Silva, em nome do partido Rede Sustentabilidade. Foi o primeiro passo para um governo de coalizão baseado em programas de ação, e não em distribuição de cargos ou benesses fisiológicas.
O mesmo aconteceu recentemente na Alemanha para a formação da nova aliança que dá sustentação ao sucessor de Angela Merkel, o primeiro-ministro Olaf Scholz. A Alemanha será governada pela primeira vez em nível federal por uma coalizão de três partidos, o que já está sendo conhecida como uma 'coalizão semáforo', devido às cores dos partidos social-democrata (vermelho), liberal (amarelo) e verde.
O acordo de coalizão prevê mudanças significativas na política ambiental da Alemanha, com grandes investimentos em energias renováveis. Os verdes, o terceiro partido mais votado na eleição de setembro, conquistaram 14, 8% dos votos, já o SPD foi o mais votado, com 25, 7%, e os liberais ficaram em quarto, com 11, 5%. O Partido Verde terá cinco ministérios (Exterior, Economia e Clima, Agricultura, Família e Meio Ambiente).
Depois do apoio a Lula, os bolsonaristas caíram em cima de Marina, relembrando os problemas causados pelo PT na campanha do marqueteiro João Santana de 2014, mas os fatos políticos ajudam a reforçar a decisão do Rede Sustentabilidade. Lula caiu em Minas, mas em São Paulo, onde Marina é das candidatas mais apontadas nas pesquisas para deputada federal, o ex-presidente cresceu três pontos, que compensaram essa queda. A pesquisa do Datafolha foi feita em 13, 14 e 15 de setembro, e a formalização da adesão foi nos dias 11 e 12, e o único fato político relevante foi o anúncio da união entre o ex-presidente e sua ex-ministra do Meio Ambiente.
No programa aceito pelo PT, Marina Silva reivindica o que chama de uma agenda ambiental transversal, pois 'é necessário promover o alinhamento das políticas públicas, em especial as políticas econômicas, fiscal, tributária, industrial, energética, agrícola, pecuária, florestal, da gestão de resíduos e de infraestrutura, aos objetivos gerais do Acordo de Paris, de forma a cumprir os compromissos assumidos pelo Brasil por meio de sua Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC)'.
Depois desse movimento político antecipado para o primeiro turno, Marina tem sido procurada por ONGs internacionais e órgãos de imprensa como o Le Monde Diplomatique, para falar sobre os compromissos assumidos por Lula. O objetivo é recuperar a agenda ambiental perdida, para que o país retome o protagonismo internacional que já teve, com o plano de voltar a ser uma liderança no combate às mudanças climáticas e no mercado de carbono.
Segundo o documento, 'falar da agenda socioambiental é falar de justiça social, de proteção ao interesse de todos, hoje e no futuro, de uma ideia avançada de desenvolvimento do país, de relações políticas e sociais, de distribuição correta e equitativa dos bens da natureza'. Marina considera que em 'nenhum outro pais as condições naturais para uma transição justa para uma economia de carbono neutro são mais evidentes do que no Brasil'.
O documento cita a capacidade de gerar energia de fontes renováveis como 'biomassa, solar, eólica e hidrelétrica, desde que em bases sustentáveis', e ressalta que temos 'as maiores áreas de florestas entre os países tropicais, enorme biodiversidade e a segunda maior reserva hídrica do mundo'. As políticas governamentais devem estar voltadas a uma estratégia de longo prazo de descarbonização da economia, com emissão líquida zero de gases de efeito estufa até 2050.
'Estamos apontando o rumo de uma nação e de um mundo melhores para todos, sem os abusos insustentáveis que nos levam a tanta miséria, injustiça, insensatez e destruição', diz o documento. A união de Marina e Lula implica mudança de rumo radical na política ambiental e traz preocupação para parte do agronegócio. No entanto, no documento, o Rede Sustentabilidade esclarece que um Sistema Nacional de Rastreabilidade de Produção Agropecuária promoverá a legalidade da cadeia produtiva e reposicionará o Brasil nos mercados internacionais, por meio do aumento da credibilidade socioambiental e sanitária de seus produtos.
Uma das principais propostas é a criação de uma Autoridade Nacional de Segurança Climática, que seria responsável pelo 'estabelecimento de metas e verificação da implementação das ações para a redução das emissões de gases de efeito estufa, aumento de resiliência e preparação para adaptação às mudanças climáticas'.
"As políticas governamentais devem se voltar à descarbonização da economia, com emissão zero de gases de efeito estufa até 2050".