A questão já não é saber quem será o vice escolhido por Bolsonaro na campanha à reeleição, mas ressaltar por que ele foi escolhido. O general Braga Netto, atual ministro da Defesa, não dará um voto a mais para a chapa, enquanto o general Hamilton Mourão, atual vice, a esta altura já poderia ampliar o eleitorado de Bolsonaro pelas razões inversas às que levaram o presidente a substituí-lo por Braga Netto.
Quando compôs a chapa para concorrer em 2018, Bolsonaro cogitou nomes de políticos, mas acabou se convencendo de que colocar um general de quatro estrelas seria uma maneira de desencorajar aventureiros que porventura ambicionassem seu lugar. Mourão era um general linha-dura, que já havia sido punido pelo Exército por ter, mais de uma vez, insinuado que os militares poderiam entrar em ação caso a esquerda “saísse da linha”. Tratou um “autogolpe” como parte do jogo e, assim como Bolsonaro, tinha o coronel Ustra como seu herói, justificando certa vez que “heróis também matam”.
Nesses pouco mais de três anos de mandato, Mourão não mudou de pensamento, mas portou-se como alguém que tem noção da posição que ocupa. Soube adaptar-se à liturgia do cargo. Assumiu posições mais moderadas que o chefe em diversas ocasiões, a ponto de ter sido visto como uma solução para substituir Bolsonaro em caso de impeachment, exatamente o contrário do que Bolsonaro e seus filhos queriam quando o convidaram para o cargo.
Exatamente por Mourão ser mais moderado que o desejado, Bolsonaro deu várias demonstrações públicas de que não o queria mais, deixou de convocá-lo para reuniões ministeriais e tirou-o antecipadamente da chapa pela reeleição. Não quer dizer que Mourão tenha se tornado um liberal da noite para o dia, mas, de que é mais civilizado do que Bolsonaro, não há dúvidas. Braga Netto, ao contrário, foi endurecendo à medida que o tempo passava, e o gosto pelo poder aumentava.
Sua última atuação pública havia sido como interventor no Rio de Janeiro para combater a violência das milícias, e o resultado foi bom. O general teve um bom desempenho na função e demonstrava capacidade de diálogo com políticos e jornalistas. Quando foi indicado para ministro-chefe da Casa Civil, fazia parte daquela turma de militares identificados como os “moderadores” de Bolsonaro, os que atuariam nos bastidores para contê-lo nos arroubos autoritários.
Ao contrário, quem controlou Braga Netto e outros militares de seu entorno foi o próprio Bolsonaro. Os que não concordaram com os rumos que o governo ia tomando foram paulatinamente sendo jogados para fora, transformaram-se em inimigos, mais que adversários.
Braga Netto já demonstrou que é da linha dura, saudosista dos tempos militares. É uma jogada de risco para Bolsonaro. O Centrão queria um político como vice, e, com a escolha de Braga Netto, o presidente demonstra que não confia muito no grupo. Com um político do Centrão como vice, a chance de “armarem” contra ele aumentaria muito. Com Braga Netto, fica quase impossível uma tentativa de impeachment ou reação em alguma eventual dissidência com o governo, caso Bolsonaro seja reeleito.
Bolsonaro está reforçando a imagem de presidente linha-dura, extrema direita, militarista, o que lhe garante apoio de cerca de 30% do eleitorado, mas não amplia sua votação; ao contrário, a restringe. Braga Netto não o ajuda a ganhar votos, mas ajudará a governar, se vencer a eleição.
O Centrão já tenta convencer Bolsonaro há bom tempo de que mais um general na chapa não é bom para sua candidatura, mas ele agora quer é se defender do próprio Centrão, a quem entregou o comando político do governo. Se reeleito, até mesmo essa relação cordial e submissa com o Congresso voltará a ser conflitante. O espírito autoritário de Bolsonaro e seu entorno será reforçado pelo que entenderão ser o respaldo popular para avançar sobre a democracia.