Os rostos da convenção para aprovar o nome petista à nossa Prefeitura exibiam um choque inesperado do novo, a realinhar o partido no Rio de Janeiro. Molon brotou numa aposta radical contra as espertezas políticas ou os jogos cansados de maiorias em bem desse despertar do “povo de Lula”. Não se trata apenas do aproveitamento do embalo da popularidade do Presidente que não deixa dúvidas quanto ao sucesso de um nome que indicar à sua sucessão.
O Rio, ao contrário de outras matrizes históricas do PT, não desfrutou de lideranças indiscutíveis ao fio destas décadas. O nome ora votado não só é o de uma renovação geracional como aproxima a legenda da própria juventude e da busca de uma cara indiscutível para o petismo carioca. A escolha marca também a resistência às tentações das purezas radicais que, no passado mais recente, fizeram da Zona Sul o maior enclave nacional do PSOL. Identicamente sacudiu a expectativa de uma estrita realpolitik da legenda, que continua a digerir o mensalão e o clientelismo da primeira chegada do PT ao poder.
Por uma vez, nas raízes petistas desponta candidatura fora de qualquer clientela eleitoral, credenciando-se ao voto deste “povo de Lula”, por sua vez mais amplo que as vicissitudes da legenda e disputando de fato uma opção prospectiva, neste eleitorado que torna o Presidente, na sua popularidade única, imune às toadas do passadismo oposicionista.
O Rio pode ser a vitrine deste voto à frente, e do sentido real da mudança que não se coaduna com os consolos evangélicos, nem com o conformismo de uma resignação religiosa ao status quo. Uma proposta como a de Molon, por outro lado, no riquíssimo cenário de candidaturas de esquerda no Rio de Janeiro quer investir mais, no que seja já um aliancismo para uma próxima chapa presidencial, que escape às perenes dobradinhas com São Paulo e Minas Gerais.
É nesse jogo maior que Sérgio Cabral entra desde agora, ao fazer do seu homem-chave do governo, Régis Fichtner, o vice de Molon. A chapa é a deste lance à frente em que as coligações de partidos se fazem com nomes emergentes, querendo marcar o destaque com os caciques clássicos ou com a detenção do poder político pemedebista, de antes da chegada do PT ao Planalto.
As pesquisas, por outro lado, mostram que esse sentimento de mudança independe hoje de classes ou bairros, ou da geografia política a que se confinam as raposas eleitorais. Um candidato não se credencia pelas baixas rejeições, que são benefícios dos defensores do “tudo bem”, a qualquer preço. Não teria uma esperança ingênua um eleitorado que sabe, de saída, quem não quer.
Não dispomos também, por outro lado, nas atuais opções de voto em megalópoles brasileiras, tantas escolhas viáveis de uma genuína liderança de esquerda, do ombro a ombro com Molon, de Gabeira ou Jandira Feghali. Seus percentuais em conjunto não deixam dúvidas quanto a um segundo turno no Rio, que polarize a opção de mudança, frente ao derradeiro populismo a que a força evangélica empresta inaudito poder de mobilização.
No mesmo palanque de Lula, todas essas forças vão fazer do Rio o deslinde definitivo, entre as certezas de crença e a consciência efetiva de um “povo de Lula”. A chapa de Sérgio Cabral não regateou sobre a força do novo do que possa o Rio, à frente do Brasil.
Jornal do Commercio (RJ) 2/4/2008