Somente uma instituição com dois mil anos de história poderia esnobar a tecnologia, que, em nossos tempos, tornou-se o deus ótimo e máximo, atributos que os romanos dedicavam a Júpiter, deus dos deuses. Numa época em que a comunicação chegou a um estágio que jamais poderia ser imaginado pela humanidade, pelo menos até a segunda metade do século passado, a igreja recorre a um dos processos mais primitivos para comunicar o fato mais importante de sua caminhada através dos tempos: a eleição de um novo chefe.
A chaminé no telhado da capela Sistina lembra aquele processo dos índios que se comunicavam, de tribo em tribo, por meio da fumaça de fogueiras, fumaça que eles controlavam com panos ou esteiras de palha, criando um código que seria o ancestral do sistema usado por Morse.
Espantoso ainda é que, durante séculos, o sinal emitido pela chaminé só era visto pelos romanos que se aglomeravam na praça São Pedro. A notícia custava a chegar ao resto do mundo. Andou um pouco mais depressa com a invenção do telégrafo. Uma prova a mais de que a igreja não tem pressa nem mesmo nas questões que nada têm a ver com o dogma e a moral.
O herói da Maratona correu 42 quilômetros para dar a notícia de uma batalha. Cumpriu sua missão e morreu ainda quente da corrida. A carta de Pero Vaz Caminha demorou um tempão para dar a notícia da descoberta ou do achamento do Brasil a dom Manuel, o Venturoso, venturoso, entre outras coisas, por causa daquela notícia em si.
O atentado de 11 de Setembro foi visto ao mesmo tempo por bilhões de pessoas espalhadas pelo mundo. A rapidez da internet, a imagem imediata da TV não alteraram o sentido e o design da chaminé que recolherá a fumaça do gigantesco fogão em que será cozinhado o novo papa. Fogão decorado por Michelangelo. Fumaça efêmera, que não dará para poluir o gostoso céu de Roma.
Folha de São Paulo (São Paulo) 19/04/2005