Na rua Santo Amaro, o velho High Life engolia a multidão em sua goela iluminada pelas gambiarras. Fila de povo que se estendia até a Glória. Ficamos no fim. Mas Valdomiro era homem de expedientes. Bartolomeu já se divertia desde o momento em que comprara os ingressos, não tinha pressa, saboreava lentamente o Carnaval. Valdomiro não, queria entrar logo.
- Não é preciso, Valdomiro, esperemos aqui mesmo vendo as coisas.
Ver as coisas era ver a rua, a iluminação, os bonecos de papelão em cima dos postes, os pândegos isolados que passavam. Um sujeito de camisola levava um penico na mão, cheio de vinho frisante, um pedaço de paio dentro. Bartolomeu ria, Valdomiro achava aquilo uma porcaria, prova da decadência dos tempos. Antigamente, os homens levavam relíquias que ofereciam à adoração da multidão genuflexa. Hoje se oferecia aquilo. E o povo, envinhado de fornicação, ria, achava graça.
Para fugir de tais espetáculos, ou porque tivesse pressa em entrar nos salões, Valdomiro arrastou-nos até a porta sob protestos gerais. Ele à frente, rompendo a turba, Bartolomeu cerrava o pelotão, distribuindo sorrisos e escusas. Os homens botavam olhos safados em cima de minha mãe.
Já próximo ao portão, Bartolomeu encontrou um colega de repartição, o Souza, escriturário ainda, muito magrinho e enfezado, cara de turco. Vestia refulgente legionário estrangeiro, calças azuis, botinas e blusa branca, chapéu com aquele paninho vermelho caído sobre a nuca, a proteger-lhe de escaldantes sóis africanos.
Trocaram cumprimentos, sorrisos, riram muito, por nada mesmo, apenas porque se encontravam. Ficamos sabendo, pelo legionário, que o apelido de Bartolomeu na repartição era Cu-de-ferro.
O porteiro conhecia Valdomiro:
- Pode entrar, a casa é sua. Nossos tempos de Balalaika!