Nunca li nem perdi tempo pensando em Tom Wolfe, que andou por aqui durante a Bienal do Livro, da qual não fiz parte por motivos de saúde. Mas, num jantar no bonito apartamento do Paulo Rocco, presidente do Sindicato Nacional dos Editores e Livreiros, o encontrei com seu elegante terno claro, contrastando com a roupa escura dos demais convidados. É magro e tem o rosto bastante enrugado, do contrário poderia parecer o Robert Redford quando faz filme baseado em romance de Scott Fitzgerald.
Ele andou dizendo muita coisa por aí. Confessou que votou em Bush -o que não chega a ser crime. Milhões de norte-americanos fizeram o mesmo e não merecem a fogueira por causa disso. De suas declarações, uma delas me pareceu bem colocada. Nos Estados Unidos, a esquerda perdeu o discurso, não tem mais uma causa concreta para brigar contra o sistema nem mesmo para justificar uma opção política.
Creio que, em diferentes escalas, o mesmo acontece em diversos países do mundo, inclusive no Brasil. A começar pelo óbvio: a esquerda está no poder. Houve tempo em que um latifundiário, um bom sujeito sem formação política e intelectual, como João Goulart, foi considerado esquerdista radical -para muitos, um comunista de carteirinha. A direita promoveu sua deposição -só não o matou porque ele se exilou. Se Jango não era esquerdista, a causa defendida pelas esquerdas estava nas ruas, na mídia, pediam-se reformas que iam da agrária à remessa de lucros.
O governo está hoje nas mãos de gente que foi exilada, presa, que pertenceu e pertence a partidos de esquerda em suas diversas nuances. Mas não há realmente uma causa a defender e pela qual os heróis possam morrer. Todos os que estão lá em cima dizem a mesma coisa, desde que não façam marola e desagradem o poder econômico que vem de fora, mantendo e ampliando a injustiça social, o arrocho salarial e a desilusão que a cada dia se torna maior.
Folha de São Paulo (São Paulo) 18/05/2005