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Causa e consequência

 

Toda essa polêmica sobre as gafes cometidas em série pelo ministro da Saúde Marcelo Castro, até chegar ao “sincericídio” de admitir que perdemos a guerra contra o mosquito da dengue, da zika e da chicumgunha, só tem importância por um aspecto: a maneira como os cargos são preenchidos. 

Juntar causa e consequência não é um esporte muito praticado no Brasil, mas o fato de que a corrupção já aparece como o principal problema do país pode indicar que os brasileiros finalmente estão descobrindo que ela é uma das causas da crise em que estamos metidos.

Não adianta a presidente Dilma ficar nervosa com os desacertos verbais de seu ministro – logo quem –, se o substituto também será escolhido da mesma maneira e, pior que isso, provavelmente não haverá substituto, pois Marcelo Castro foi nomeado por indicação do então líder do PMDB na Câmara Leonardo Picciani, que não pode abrir mão de seu apoio, pois continua lutando para se manter no cargo.   

A presidente Dilma sabe que, na atual circunstância, é melhor para ela continuar com um ministro da Saúde ineficiente e boquirroto do que perder o apoio do líder do PMDB. O deputado Hugo Motta, colocado pelo presidente da Câmara Eduardo Cunha na presidência da CPI da Petrobras e agora disputando a liderança na Câmara sob os mesmos auspícios, já saiu em defesa do ministro da Saúde, nomeado pelo mesmo Picciani com quem disputa agora a liderança na Câmara.

Isso quer dizer que Motta já vislumbra na crise da Saúde uma boa oportunidade para arrebanhar alguns votos na bancada peemedebista que apóia o ministro Castro, que deve estar muito irritado com as críticas que vem recebendo do Palácio do Planalto.

Não será surpresa se nos próximos dias, a pedido de Picciani, a própria presidente Dilma ou seu ministro principal Jaques Wagner sejam obrigados a dar declarações favoráveis a Marcelo Castro. Isso porquê a disputa pela liderança do PMDB está acirrada, e Picciani corre o risco de perder a eleição, o que vai levar novamente o impeachment para o centro do debate político.

Até aqui, tratamos de dois aspectos da crise brasileira: as negociações internas do PMDB, e a maneira como os governos nomeiam seus principais ministros. Digamos que as áreas da Saúde e da Educação fossem prioritárias para esse governo. Se pegarmos os critérios utilizados nas indicações de seus condutores, veremos que não pode dar certo esse sistema deturpado de presidencialismo de coalizão, que se transforma em cooptação pura e simples.

Em nenhum momento se fala sobre projeto de governo, sobre programa para a Saúde e a Educação. A “Pátria Educadora” não passou de um slogan vazio, e a escolha do filósofo Renato Janine apenas uma propaganda enganosa dessa prioridade. Não havia intenção de implementar nada, nem foi dada ao ministro condição mínima de atuação nos cerca de 5 meses em que esquentou a cadeira do ministério da Educação.

Logo um arranjo político obrigou a sua saída para acomodar o então Chefe do Gabinete Civil, Aluizio Mercadante, que voltou para a Educação como uma espécie de castigo por má atuação na coordenação política do Palácio do Planalto.

Então, não adianta a presidente Dilma ficar irritada com as tiradas do ministro da Saúde, assim como não deve esperar nada de um ministro como o da Ciência e Tecnologia, Celso Pansera, cujo maior mérito é ser “muito simpático, um gringão”, como o definem no PMDB do Rio, e ter sido dono de um restaurante rodízio na Baixada Fluminense.

Escolhido pelo PMDB do Rio, ele está lá da mesma maneira que Marcelo Castro está na Saúde, escolhido por Picciani para fortalecer a ala do PMDB que é contra o impeachment de Dilma. E como agora vão exigir deles o que não podem oferecer?

Já estamos vendo uma nova edição da mesma novela. Newton Cardoso Junior anuncia que em troca de apoio a Picciani, Minas exige a nomeação do ministro da Aviação Civil “antes da eleição”.

Do jeito como as negociações partidárias são feitas, é impossível imaginar uma saída a curto prazo dessa situação de anomia, onde ninguém é de ninguém e não se sabe quem manda, e com que objetivo.    

O Globo, 27/01/2016