ão parece ser uma decisão sem riscos a presença de um assessor especial da presidência da República para acompanhar a eleição hoje na Venezuela. Sem riscos, e sem possibilidades de êxito. A começar pela proibição do governo Maduro de haver observadores internacionais que não sejam ligados de alguma maneira ao projeto político que pela primeira vez em 25 anos pode ser derrotado em uma eleição.
A presença de Celso Amorim carimba oficialmente o governo Lula como um governo amigo da Venezuela, o que, de saída, transforma as impressões do enviado especial brasileiro em tendenciosas a favor de Maduro, o que não é bom para o Brasil como líder regional respeitado. Desta vez Lula não atravessou a rua para escorregar na outra calçada. Pegou um avião.
Quadro diferente disso seria um ambiente político propício para declarações independentes, denunciando que a eventual vitória de Maduro foi forjada. Não parece haver condições para tal, e por isso o governo brasileiro não deveria estar lá. Se o governo Maduro proibiu representantes da União Europeia, da ONU e diversos ex-presidentes da América Latina de comparecerem para acompanhar in loco o desenrolar da eleição, por que permitiu que o Brasil estivesse presente?
Provavelmente por isso Celso Amorim tenha dito que não é um “observador internacional“, e, portanto, não tem obrigação de emitir opinião sobre a lisura da eleição. Pretende sair da Venezuela calado, e transmitir ao presidente brasileiro suas opiniões, que poderão ser colocadas sob sigilo pelo governo. Só saberemos, nesse caso, a opinião de Amorim através de decisões brasileiras de política externa, a serem trabalhadas pelo Itamaraty.
A eleição de hoje já não é limpa nem idônea desde quando a candidata da oposição Maria Corina Machado foi proibida de concorrer. Se hoje o candidato oposicionista Edmundo Gonzalez é apontado como o favorito pelos institutos de pesquisa de opinião independentes, a posição de Corina seria provavelmente mais forte ainda. Some-se a isso a prisão de oposicionistas, o fechamento de fronteiras, os empecilhos burocráticos que transformaram mais de 7 milhões de eleitores no exterior em pouco mais de 50 mil votantes autorizados, não é razoável que o governo brasileiro decida se empenhar em defesa de Maduro enviando um assessor tão importante quanto Celso Amorim para fazer parte de uma farsa.
Pela relação pessoal de Lula com Maduro, as tentativas de explicar suas frases e seus arroubos autoritários por parte de auxiliares como o próprio Amorim, o Brasil não parece estar preparado para denunciar prováveis desvios que possam acontecer na Venezuela. O presidente Lula tinha uma maneira peculiar de defender Maduro: não se pode considerar que a eleição será fraudada antes que ela aconteça, disse certa vez. Parece uma atitude cautelosa, mas é apenas um voto de confiança no ditador.
Sabe-se que depois que Maduro mandou que tomasse chá de camomila para acalmar-se, Lula está irritado, ou desgostoso, com seu aliado, ou ex-aliado. Mas foi ele quem buscou essa confusão apoiando um ditador claramente desequilibrado, que diz falar com um passarinho que é Chávez encarnado. Todos os sinais já emitidos permitem que se diga que a eleição não será idônea, com desigualdade de forças entre o governo e a oposição.
Mas o problema político não se resolverá amanhã, mesmo que a oposição seja considerada vencedora. Por uma estranha decisão do Tribunal Eleitoral, controlado por Maduro, a posse do novo presidente só se dará em janeiro. O ditador derrotado continuará, portanto, à frente do governo por quase seis meses, e poderá produzir provas à vontade para tentar anular a eleição. A aceitação da derrota só será possível se os militares derem sinais inequívocos de que não apoiarão o tal “banho de sangue” previsto por Maduro em caso de derrota.