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Canções do exílio

 

Uns dias entre Paris e Lyon, encontro e reencontro amigos que se auto-exilaram nos anos de chumbo e por lá ficaram, em parte porque se adaptaram, em parte porque desconfiam de um revertério que pode fazer o trem andar para trás.


Prisioneiros políticos, exilados e auto-exilados pagam um preço à desinformação e à apreensão de uma realidade inexistente. Na prisão, dorme-se cada noite com dois sentimentos contraditórios: que no dia seguinte seremos fuzilados ou chamados a tomar o poder pelo povo que finalmente descobriu que estávamos certos e somos indispensáveis ao progresso e à paz da nação.


No exílio, a alternativa não chega a ser tão dramática ou cômica, mas prevalece um estado de espírito datado dos tempos em que as circunstâncias nos obrigaram a provar "as uvas ácidas da ausência" - para lembrar o verso de André Eloy Blanco.


Amigos e conhecidos perguntam pelas novidades. Acreditam que a direita está impedindo Lula de governar, criando-lhe embaraços e lançando cascas de banana em seu caminho redentor.


Não é fácil explicar que as coisas não estão claras ideologicamente, que não existe no País um único representante da direita, com exceção do meu amigo Olavo de Carvalho. Até certo ponto, a visão maniqueísta dos brasileiros ali radicados por motivos políticos é fruto de um contágio: na França não houve um único colaborador, todos foram resistentes, todos pegaram em armas contra os nazistas e dinamitaram as estradas de ferro para evitar os deslocamentos das tropas de ocupação.


Assim também ocorreu com o Brasil. Todos foram contra o regime militar, somente os empedernidos conservadores, áulicos de Washington, dilaceraram a democracia e o progresso do nosso povo. E continuam atuantes, donos dos canais do verdadeiro poder, impedindo que Lula se torne o presidente que todos esperavam e mereciam.




Jornal do Commercio (Rio de Janeiro - RJ) em 03/12/2003

Jornal do Commercio (Rio de Janeiro - RJ) em, 03/12/2003