O atentado na Espanha trouxe um ingrediente novo à luta contra o terror. O "day after" ainda não passou, mas já se percebe algum interesse do governo local em atribuir o ato terrorista ao ETA, enquanto a maioria dos observadores internacionais coloca a chacina de 11 de março como etapa da guerra iniciada em 11 de setembro de 2001. Há suspeita de manipulação política nas informações.
Até que surjam as provas definitivas sobre a responsabilidade do atentado, a confusão está armada. Ontem foi dia de eleições na Espanha, e não há dúvida de que o impacto da tragédia, tal como aconteceu nos Estados Unidos, poderia reunir o povo em torno do governo, que bem ou mal representa a nação. Mas nem sempre isso acontece.
A rotina do movimento separatista basco atua com tática diferente e em proporção infinitamente menor. O ETA combate e procura desestabilizar o Estado espanhol, lutando pela autonomia da sua região. Não pretende se indispor com o povo espanhol, do qual é parte. Pelo contrário. Mais cedo ou mais tarde, mesmo obtida a autonomia institucional, terá de se relacionar fraternalmente com aqueles que ficaram do outro lado de suas fronteiras.
Simultaneamente, temos as repetidas ameaças dos terroristas de Bin Laden, que anunciaram e continuam anunciando novos atentados contra aqueles que se envolveram favoravelmente aos interesses norte-americanos na Guerra do Iraque, uma guerra que ainda não acabou. Espanha, Itália e Inglaterra foram alianças decisivas nos planos de Bush de resolver o problema do terrorismo internacional por meios militares, desdenhando a única solução possível, que é a negociação política.
Não negociar com os terroristas é ato de guerra, não chega a ser um ato político; pelo contrário, é a negação da política. Evidente que nem todas as exigências do mundo árabe poderão ser aceitas pelo Ocidente, mas algumas, como a crise da Palestina, distenderiam o confronto, colocando-o em níveis menos dramáticos.
Folha de São Paulo (São Paulo - SP) em 15/03/2004