No meu tempo, ainda existiam virgens, mas poucas. Pode parecer paródia de uma célebre frase de Machado de Assis, mas é minha mesmo, nascida de uma vulgar meditação sobre o rótulo de diversos vidros e latas de azeite. Não bastando serem virgens, os azeites de agora são “extra virgens”. Um “plus” a mais na imaculada confecção dos azeites.
Honestamente, não consigo entender o que seja “extra virgem”. Compreendi com inesperada rapidez o que era uma “demi vierge” – havia muitas então, de largo uso numa época em que as moças guardavam a castidade para o casamento. Conheci algumas, deram para o gasto, mas nenhuma delas se atribuía a condição de extra. Eram virgens e bastavam.
Não sei por que estou misturando azeites e moças. Aprecio as duas coisas, mas não sou fanático pela virgindade de ambos. Houve época em que faltava azeite de oliva na praça, quebrava-se o galho com óleo de girassol, soja, coco e amendoim. Nenhum deles se preocupava com a virgindade e muito menos com a condição de extra.
Também as mulheres não se vangloriavam da condição de extra virgens. Algumas tinham até constrangimento em alegar que não podiam ir além de certo ponto por serem virgens e desejarem chegar virgens ao casamento. Algumas conseguiam a façanha.
Voltando aos azeites. Há especialistas para tudo, até para saber se um azeite é virgem, extra virgem ou não é uma coisa ou outra. Já com as mulheres, a coisa é mais fácil, não precisa de especialistas. Na Sicília, depois da noite de núpcias, a família da noiva exibia para o povo os lençóis manchados de sangue como prova da virgindade da moça.
Tempos incultos e bárbaros. O melhor é acreditar na virgindade extra dos azeites e na virgindade provisória das mulheres.
Folha de S. Paulo (SP) 07/12/2008