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Análise: Todo cuidado é pouco

 

Não dava mais para segurar. A escalada da violência no Rio chegou a tal ponto de descontrole que a intervenção apresentou-se como um recurso excepcional, mas indispensável. Porém, sozinha, ela não faz milagres. O seu êxito depende da integração entre as Forças Federais, Estaduais e Municipais, uma conquista que a experiência recente já demonstrou não ser fácil. Mas é fundamental.

O decreto do presidente Temer, que ainda precisa ser aprovado pelo Congresso, foi, digamos, inaugurado por duas declarações _ uma que tranqüiliza e outra que preocupa. A primeira foi do ministro da Defesa, Raul Jungman, afirmando que o Exército não exercerá o papel de polícia. Sabe-se que, além de não ser sua atribuição, a medida cautelar evita o risco de contágio das tropas com o poder de corrupção do crime organizado, um mal que contaminou parte da PM, criando a chamada “banda podre”.

A outra foi justamente do recém-nomeado interventor federal, o general Walter Souza Braga Netto. A caminho do gabinete presidencial, quando perguntado se a situação no Rio estava muito ruim, fez que “não” com o dedo e acrescentou enigmaticamente: “ Há muita mídia”. 

O que o general quis dizer com isso, que a culpa é nossa, da imprensa? Tomara que não, porque esse é o discurso dos que acreditam defender o Rio tentando esconder nossas mazelas, ou seja, tapando o sol com a peneira. Como aqueles reis que mandavam matar o emissário da má notícia _depois de recebê-la, claro _ é mais cômodo transferir a responsabilidade para a imprensa.

Essa, felizmente, não é a opinião do presidente Temer, que chegou a comparar o crime organizado no nosso estado com uma “metástase” que se espalha por todo o país. Daí admitir que a providência era extrema: “às vezes é necessário tomar essas atitudes para restaurar a ordem”.

O governador Pezão gostaria que a medida fosse por tempo indeterminado.

Vamos com calma. Para quem viveu o golpe militar de 1964, a lembrança ainda permanece como trauma. Acreditava-se então que a intervenção seria uma questão de meses. Durou 21 anos. Portanto, todo cuidado é pouco.

O Globo, 17/02/2018