RIO DE JANEIRO - Mais por cautela do que por temperamento, não sou dado a exaltações, mesmo assim, volta e meia me descubro um carioca exaltado, apesar dos milhões de motivos que o Rio me dá para a vergonha própria e a miséria coletiva. Em momentos de fossa urbana, não adianta pensar no Cristo do Corcovado, em Machado de Assis ou nas garotas de Ipanema. A solução é enfiar o rabo entre as pernas e assumir o mico de ter nascido e de viver numa cidade com tantos e tais problemas.
Foi uma foto quase inocente que vi nos jornais. No convés do porta-aviões George Washington, que está fundeado na baía, tendo ao fundo um dos nossos símbolos mais queridos, o Pão de Açúcar, um marinheiro norte-americano passa nos braços e no rosto o repelente contra os mosquitos da dengue.
De tanto ver documentários mostrando como se constroem, se armam e se defendem as poderosas máquinas de guerra, não podia imaginar que em seu arsenal, cheio de mísseis atômicos, radares, rastreadores de satélites e suprimentos capazes de sustentar uma cidade de 4.000 habitantes, houvesse um carregamento especial de prosaicos repelentes, desses que compramos nas pacíficas farmácias locais.
Aliás, e creio já ter comentado em crônica anterior, de tanto ver documentários sobre a construção de porta-aviões, acho que, se me derem equipamento adequado e material bastante, eu serei capaz de montar um deles, aqui mesmo, para flutuar na lagoa, em frente à minha varanda. Desde o corte da primeira chapa de aço à instalação do aparelho de som com os acordes do "Anchors Away".
Só não poderia imaginar a necessidade de nossos repelentes domésticos. Será um dos itens mais fáceis de obter. Tenho um generoso estoque no banheiro para o que der e vier.
Folha de S. Paulo (SP) 27/4/2008