A faixa etária à qual pertenço tem poucas vantagens. Uma delas seria a de não me admirar de nada do que acontece neste mundo, mais do Diabo do que de Deus. Em criança, acho que eu entendia tudo sem pedir explicações. Chovia porque chovia, meu avô morreu porque tinha de morrer e assim eram as coisas e as pessoas.
Hoje, fico admirado da facilidade com que se distribuem o bem e o mal, sobretudo nas diversas mídias existentes, inclusive e principalmente na internet: desde o bom remédio para aumentar o pênis até o ex-senador que se envolveu em uma cachoeira de escândalos.
Há seguramente 20 anos, a mídia comunica que Paulo Maluf roubou milhões de dólares e que tribunais de Justiça e organismos internacionais da polícia provam, com documentos, número e datas das contas, que o ex-prefeito de São Paulo desviou verbas vultosas para os paraísos fiscais, até mesmo para as ilhas Papuas -se lá existem bancos.
Apesar de tantas e tamanhas provas, o agora deputado federal é cortejado toda vez que se pensa em eleições e formação de palanques. Há um documento em cartório pelo qual o malsinado político autoriza qualquer habitante do planeta Terra a retirar qualquer quantia depositada em suas contas secretas.
É o caso dos vilões de nossa vida pública, que se estende também a artistas, a cantores e a gente da TV e do esporte. Maluf é um vilão "hors concours": cada vez que perde uma eleição tem sua morte política decretada pelos entendidos. Roberto Carlos, a cada disco que lança, consegue atingir o nível mais abominável da música brasileira. Os programas evangélicos mereciam um campo de extermínio capaz de concentrar tantos fiéis que buscam salvação e milagres.
Tamanho maniqueísmo me espanta. Vivo sem vontade neste admirável mundo de heróis e vilões.
Folha de São Paulo, 24/7/2012