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Abusos do poder

 

Não espero muita coisa da CPI que acaba de ser aprovada para apurar o escândalo dos Correios. Primeiro, porque os escândalos deixaram de ser pontuais, criaram uma metástase no organismo nacional, não adianta extirpar um tumor aqui porque há outros ali, em diferentes órgãos, alguns detectados, outros crescendo na sombra.


Será fácil para o interessado -o governo em si- melar a CPI, recomendando a seus partidários a falta de quorum nos lances mais importantes das investigações. Será mais uma CPI que nem terminará em pizza, simplesmente não terminará, nem mesmo em pizza.


Consideração paralela. Uma juíza de primeira instância pretende tornar inelegível um pré-candidato à sucessão presidencial do ano que vem. Deu uma sentença cheia de considerações demagógicas e partidárias, voltou atrás, voltou novamente atrás, testemunhas do processo também voltaram atrás, tudo leva a crer que a sentença cairá nas instâncias superiores.


Mas não era disso que queria falar. O crime alegado na última eleição municipal em Campos, o do uso do poder político, está de tal forma institucionalizado entre nós que, para não ir muito longe, o governo Lula o praticou descaradamente nos últimos dias, em desespero, abrindo verbas e cargos para convencer parlamentares a retirarem o nome da convocação da CPI. O mesmo crime foi praticado diversas vezes por FHC, sobretudo quando arrancou do Congresso a emenda que possibilitou a sua reeleição. Fatos sabidos e consabidos por todos -e não contestados.


A mídia deitou e rolou, cantando hinos e loas ao saneamento que a tal juíza promoveu na vida nacional, arrancando a erva daninha que brotou em Campos. Mas não fez nenhum comentário sobre o abuso do poder econômico praticado cinicamente pelo governo federal para impedir a CPI.


Disso tudo, conclui-se que não é apenas a classe política que está perdendo a credibilidade.


 


 


Folha de São Paulo (São Paulo) 28/05/2005

Folha de São Paulo (São Paulo), 28/05/2005